Desde que Donald Trump anunciou tarifas de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos, com início previsto para 1º de agosto, as estruturas da extrema-direita brasileira começaram a balançar. A expectativa era de que o governo Lula se sentisse acuado e que a política externa brasileira fosse vista com desprestígio. Paralelamente, a família Bolsonaro apostava que, diante das ameaças de Trump, o Supremo Tribunal Federal recuasse no processo contra o ex-presidente ou que o Congresso, em articulação com o Planalto, aprovasse uma anistia aos golpistas de 8 de janeiro, livrando Jair Bolsonaro da prisão.
Nada disso aconteceu e nem parece estar perto de acontecer. Pesquisas de opinião realizadas após o anúncio do tarifaço indicam uma leve recuperação da popularidade de Lula, cuja resposta firme às ameaças de Trump foi bem recebida pela população. Tampouco houve qualquer resposta coordenada de responsabilização do presidente Lula ou do Itamaraty pelos os setores exportadores que serão diretamente afetados pelas medidas do presidente norte-americano. Mesmo políticos da oposição viram que, ao menos por agora, não cai bem defender que a soberania nacional seja ameaçada e as instituições brasileiras desacreditadas.
Na extrema-direita, os últimos acontecimentos provocaram atritos e deixaram aliados de Bolsonaro perdidos. Afinal de contas, é para ser nacionalista ou não é? É para defender o "Brasil acima de tudo" ou depende da ocasião?
A verdade é que a vida não está nada fácil para aqueles que incentivaram as tarifas contra o Brasil ou que endossam o ataque às instituições brasileiras por parte de um governo estrangeiro. Na esteira dos acontecimentos, duas figuras centrais da extrema-direita brasileira entraram em desacordo. Estamos falando de Eduardo Bolsonaro e o atual governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.
As tarifas impostas por Trump devem atingir em cheio empresários e produtores do estado de São Paulo. Por isso, se alinhar automaticamente ao discurso da família Bolsonaro e apoiar as tarifas de Trump seria uma atitude suicida por parte de Tarcísio.
De olho em 2026, o governador paulista adotou uma postura mais amena do que esperado pelos bolsonaristas radicais e chegou a se reunir com o encarregado de Negócios da embaixada dos Estados Unidos, em Brasília, para chegar a uma saída negociada. O filho de Bolsonaro não gostou nada do tom brando do governador.
Nas redes sociais, Eduardo afirmou que, se Tarcísio estivesse realmente preocupado com a indústria paulista, ele estaria "defendendo o fim do regime de exceção que irá destruir a economia brasileira". Dias depois, os ânimos se acalmaram, mas o pano de fundo que gerou os atritos se tornou ainda mais complexo.
A postura de Eduardo Bolsonaro tem incomodado outras figuras da extrema-direita, como Hamilton Mourão, que foi vice-presidente na chapa de Bolsonaro em 2018. O centrão, que oscila entre participar do governo com seus cargos e ministérios e apoiar um candidato da direita para as eleições presidenciais de 2026, não se mostrou disposto a comprar a briga da família Bolsonaro.
Agora, Tarcísio tenta se equilibrar entre demonstrar fidelidade a Bolsonaro e à sua base mais radicalizada, ao mesmo tempo em que não pode embarcar em um discurso político que apoia medidas econômicas que farão com que setores da burguesia brasileira percam dinheiro.
Nesse sentido, vale perguntar: Tarcísio de Freitas conseguirá se equilibrar nessa corda-bamba e manter-se como um nome viável para disputar a Presidência da República em 2026?
Na última manifestação promovida por Bolsonaro na Avenida Paulista, não foi difícil perceber que Tarcísio já começa a se posicionar como um futuro candidato. Diferentemente do que ocorreu em abril, desta vez ele optou por centrar seus discursos em críticas ao presidente Lula e às políticas do atual governo, em vez de reforçar com ênfase o discurso pela anistia aos golpistas do 8 de janeiro. No dia seguinte, os bolsonaristas mais fiéis demonstraram descontentamento com a postura do governador.
Diante do cenário de fissuras no núcleo da extrema-direita brasileira, o Supremo Tribunal Federal determinou o uso de tornozeleira eletrônica por Jair Bolsonaro com base na Lei da Soberania Nacional, após indícios de que ele teria articulado com autoridades estrangeiras para pressionar o STF e interferir no andamento de investigações. A decisão foi embasada por pedidos da Polícia Federal e da Procuradoria-Geral da República, e aprovada pela Primeira Turma do Supremo.
Tarcísio de Freitas expressou solidariedade a Bolsonaro, mas tem se esquivado de defender que o Brasil seja alvo de tarifas que se apoiam em justificativas econômica falsas e que, na verdade, buscam interferir na política e instituições brasileiras.
O objetivo do governador paulista é se estabelecer como principal nome da extrema-direita e ter apoio da burguesia brasileira para disputar as eleições presidenciais de 2026.
Para isso, ele vai precisar se equilibrar numa belíssima corda bamba. De um lado, deve buscar não se descolar da base bolsonarista mais radicalizada, o que demanda apoiar que Jair é vítima de perseguição judicial e as políticas de Trump em direção ao Brasil são legítimas. Por outro, Tarcísio também precisa do apoio das frações burguesia brasileira que estão agora diretamente ameaçadas pelas tarifas. Na prática, isso pode significar se afastar de parte do bolsonarismo, uma vez que, pelo menos até agora, a família Bolsonaro não conseguiu convencer os empresários dos setores tarifados que a culpa das medidas impostas por Trump é do governo Lula. Pelo contrário, chovem críticas às atividades de Eduardo Bolsonaro junto aos políticos dos Estados Unidos como forma de aumentar o nível de pressão da Casa Branca ao Brasil.
À medida que as tensões entre o Brasil e os Estados Unidos se aprofundarem,
essas duas posições tendem a parecer ainda mais antagônicas e transitar entre elas, cada vez mais impossível.