O maior caso de pedofilia da França: médico é acusado de estuprar centenas de crianças

O médico Joël Le Scouarnec, que abusou de 299 pacientes, enfrentará um processo que expõe falhas institucionais e provas assustadoras de seus crimes.

Na região da Bretanha, na França, terá início neste mês o maior julgamento de abuso infantil da história do país, envolvendo um cirurgião acusado de abusar sexualmente de centenas de pacientes ao longo de décadas, inclusive enquanto estavam sob anestesia, em leitos hospitalares ou pós-operatórios.

O processo começará em 24 de fevereiro, em Vannes, e deverá se estender até junho.

As acusações

Joël Le Scouarnec, médico acusado de estuprar ou agredir sexualmente 299 pacientes entre 1989 e 2014, responde por crimes cometidos contra 158 homens e 141 mulheres, sendo que 256 das vítimas tinham menos de 15 anos, com média de idade de 11. O réu admitiu parcialmente algumas acusações, mas refutou outras.

Provas reveladoras

As principais evidências do caso são os cadernos de Le Scouarnec, nos quais ele detalhava os abusos e anotava as iniciais das vítimas. A polícia cruzou essas informações com registros médicos e identificou muitas das vítimas, algumas das quais estavam inconscientes durante os crimes, não percebendo o que acontecia.

A advogada Francesca Satta, que representa dez vítimas, destacou a magnitude do caso, afirmando que nunca houve um julgamento com tantas vítimas. Ela ressaltou a dificuldade das vítimas, agora na faixa dos 30 e 40 anos, em ouvirem os relatos dos abusos registrados nos diários do acusado, especialmente considerando que os crimes ocorreram quando ainda eram crianças.

Denúncias e investigações

O caso foi revelado em 2017, quando vizinhos de Le Scouarnec denunciaram suas ações à polícia. A investigação encontrou imagens violentas, anotações manuscritas e uma coleção de bonecas escondida em sua casa.

Em 2020, o cirurgião foi condenado a 15 anos de prisão por abusar de quatro crianças, incluindo uma paciente, e atualmente está cumprindo pena. Satta disse que foi a primeira vez que viu um policial chorar ao confrontar as provas encontradas.

Frédéric Benoist, advogado da organização de defesa infantil La Voix de L’Enfant, criticou as falhas das instituições que permitiram que Le Scouarnec continuasse a cometer os abusos. Ele entrou com uma ação contra o Estado por negligência na proteção pública.

Falhas das instituições francesas e impunidade

Benoist relembrou que, em 2004, o FBI alertou as autoridades francesas sobre as atividades online do médico, mas ele não foi preso, apenas interrogado. A polícia não fez uma busca completa, deixando de inspecionar seu escritório no hospital, onde poderiam ter encontrado mais provas.

Le Scouarnec alegou que seus crimes foram resultado de problemas no casamento e de um erro isolado ao acessar imagens de abuso infantil. No entanto, em 2005, quando foi condenado por esse crime, ele não recebeu tratamento psiquiátrico nem foi proibido de trabalhar com crianças. O tribunal falhou em seguir os procedimentos necessários, como avisar o conselho médico e o hospital.

Apesar de médicos do hospital terem alertado sobre seu comportamento estranho e o uso de imagens de abuso infantil, Le Scouarnec continuou trabalhando na área, sem que medidas efetivas fossem tomadas pelas autoridades.