Entenda como Bolsonaro e Braga Netto atuaram como figuras centrais em plano de golpe de Estado, segundo relatório da PF
Na última terça-feira, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, decidiu levantar o sigilo do relatório final da Polícia Federal (PF) que investiga um plano de golpe de Estado no Brasil em 2022. O documento, que conta com mais de 800 páginas, traz à tona as conclusões da PF sobre um esquema elaborado por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em janeiro de 2023.
A investigação resultou no indiciamento de 37 pessoas, incluindo o próprio Jair Bolsonaro. O relatório foi enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR), que agora avaliará a possibilidade de apresentar uma denúncia formal contra os envolvidos.
Segundo o relatório, a PF afirma que Bolsonaro "efetivamente planejou, ajustou e elaborou um decreto que previa a ruptura institucional". Os investigadores destacam que o ex-presidente tinha "plena consciência e participação ativa" nas ações do grupo que discutia a possibilidade de um golpe de Estado.
O documento também indica que o general Braga Netto, ex-ministro da Defesa e candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, aprovou um plano para assassinar Lula, Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
Além disso, o relatório revela que oficiais militares de alto escalão, como o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, estavam envolvidos na trama. Mensagens obtidas pela investigação indicam que "tanques no Arsenal" estavam "prontos" para a ação golpista, evidenciando a seriedade da situação.
A PF detalha que Jair Bolsonaro buscou apoio nas Forças Armadas para implementar o golpe, mas enfrentou resistência dos comandantes do Exército e da Aeronáutica, que se mostraram relutantes em aderir ao plano. O relatório menciona que, em diversas ocasiões, Bolsonaro fez transmissões ao vivo e participou de reuniões para fomentar narrativas de fraude nas eleições, o que demonstra sua intenção de desestabilizar a ordem constitucional.
Os investigadores também apontam que Bolsonaro elaborou textos golpistas e pediu alterações na minuta de um decreto que previa a anulação das eleições, com o objetivo de garantir sua permanência no poder. Durante o depoimento do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, ficou claro que o ex-presidente solicitou que dois pontos principais fossem mantidos na minuta: a prisão do ministro Alexandre de Moraes e a realização de novas eleições presidenciais.
O relatório ainda revela que um possível decreto golpista assinado por Bolsonaro foi destruído por integrantes do Alto Comando do Exército, em um esforço para evitar que o plano fosse levado adiante. Mensagens entre Mauro Cid e outros militares indicam que, após uma reunião entre Bolsonaro, seu vice-presidente Hamilton Mourão e generais, foi decidido rasgar o documento que poderia ter sido um marco na tentativa de golpe.
Um aspecto ainda mais grave da investigação é a conclusão de que o ex-ministro da Defesa, Braga Netto, aprovou um plano para assassinar Lula, Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes. O plano, denominado "Punhal Verde e Amarelo", foi apresentado em uma reunião na residência de Braga Netto em novembro de 2022. Os detalhes do planejamento foram discutidos entre os tenentes-coronéis Mauro Cid e Ferreira Lima, e o major Rafael de Oliveira, que estavam presentes na reunião.
Apesar da seriedade do plano, os militares recuaram da tentativa de assassinato de Moraes devido à falta de apoio da cúpula das Forças Armadas. A PF relata que, em 15 de dezembro, militares estavam posicionados em locais estratégicos de Brasília para capturar Moraes, mas a missão foi abortada devido à resistência dos comandantes do Exército e da Aeronáutica.
O relatório conclui que a tentativa de golpe não se concretizou por "falta de apoio dos comandantes militares, que permaneceram fiéis aos princípios do Estado Democrático de Direito". A PF destaca que, apesar das pressões exercidas por Bolsonaro, os generais Freire Gomes e Carlos de Almeida Baptista Júnior, que lideravam o Exército e a Aeronáutica, respectivamente, se mantiveram firmes em sua posição institucional.
Além disso, o ex-ministro Braga Netto é apontado como uma figura central na busca por apoio ao plano golpista. Segundo a PF, ele pressionou os comandantes da Aeronáutica e do Exército a se unirem ao plano que visava a abolição do Estado Democrático de Direito. Braga Netto teria utilizado "táticas semelhantes às milícias digitais, incitando ataques pessoais contra os generais que se opuseram ao golpe, como Freire Gomes e Baptista Júnior".
Um dos documentos obtidos pela Polícia Federal, que foi encontrado na sede do Partido Liberal, afirmava que Lula "não subiria a rampa", referindo-se à entrada principal do Palácio do Planalto, um símbolo do ato de posse de um presidente eleito. O plano, intitulado "Operação 142", era baseado em uma interpretação distorcida do artigo 142 da Constituição Federal, que trata do papel das Forças Armadas.
A PF também relatou que havia "tanques no arsenal prontos" para serem utilizados em um eventual golpe. Mensagens trocadas entre membros do grupo revelaram que a Marinha era vista como um aliado estratégico, e havia uma expectativa de que, caso Bolsonaro tivesse tomado uma atitude mais decisiva, o Exército e a Aeronáutica poderiam seguir o mesmo caminho.
Adicionalmente, o relatório da PF expõe um plano de fuga para Jair Bolsonaro nos Estados Unidos, que teria sido elaborado após as tentativas de golpe serem frustradas. O ex-presidente viajou para o país no final de 2022, onde aguardou o desfecho do 8 de janeiro de 2023. A PF detalha que o plano de fuga foi dividido em três etapas principais: a primeira envolvia a proteção de Bolsonaro no Palácio do Planalto e na residência oficial, a segunda consistia em criar condições para ocupar estruturas estratégicas como forma de pressão, e a terceira previa a retirada de Bolsonaro do país, com a criação de uma rede de apoio logístico e militar.
A PF concluiu que a "criação de uma rede de apoio militar para a retirada do ex-presidente do país reflete o temor de que ele pudesse ser responsabilizado por suas ações após deixar o cargo".
As próximas etapas do processo dependerão da análise da Procuradoria-Geral da República, que agora tem em mãos um material robusto que pode levar a ações judiciais contra os indiciados.