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Mudanças e incertezas: a 'Lei Ônibus' de Milei avança em meio a negociações de última hora

Devido à pressão social e política, o Governo teve que remover 278 artigos.
Mudanças e incertezas: a 'Lei Ônibus' de Milei avança em meio a negociações de última horaGettyimages.ru / Luciano Gonzalez / Anadolu

A 'Lei Ônibus' apresentada pelo presidente Javier Milei, um dos projetos centrais de seu Governo, está avançando para a fase final de seu debate parlamentar em meio a intensas negociações com a oposição "que dialoga", que ainda não garantiu totalmente seu voto a favor.

As dúvidas em torno da iniciativa adiaram mais uma vez a chegada do projeto de lei para debate na Câmara dos Deputados. Primeiro, o Governo garantiu que o projeto seria discutido na quinta-feira passada. Depois, foi novamente adiado, mas finalmente foi estabelecido que seria apenas na quarta-feira, 31 de janeiro.

Dessa forma, Milei enfrentará o dia parlamentar mais intenso desde que começou a governar em 10 de dezembro, já que a sessão, que começa às 10:00, deverá ser uma maratona. Além disso, haverá uma mobilização popular nos arredores do Congresso para pedir aos deputados que votem contra o projeto de lei.

Desde que o presidente apresentou no final de dezembro a Ley Bases y Puntos de Partida para la Libertad de los Argentinos, que foi renomeada de 'Lei Ônibus' porque cobre centenas de leis que transformam completamente o funcionamento do Estado, ele insistiu que não negociaria, nem mudaria, nem cederia em nada.

Mas, a pressão social e política fez que, em um primeiro corte, o documento fosse reduzido de 664 para 523 artigos. Na sexta-feira, o Ministro da Economia, Luis Caputo, anunciou em uma coletiva de imprensa que, além disso, todo o capítulo sobre reformas fiscais seria removido.

Como resultado, a lei que será discutida em sessão plenária na Câmara dos Deputados contém agora apenas 386 artigos, 278 a menos dos que foram apresentados originalmente.

No entanto, mesmo assim, ainda não consegue-se obter o consenso de oponentes "amigáveis".

Cenários

Milei precisa do apoio dos blocos de oposição porque seu partido, La Libertad Avanza, tem apenas 38 dos 257 assentos na Câmara dos Deputados, o que é insuficiente para ter um quórum que permite o início da sessão e, acima de tudo, para que a lei seja aprovada.

Até agora, o Governo conta com o apoio incondicional dos deputados do partido Propuesta  Republicana (PRO, do ex-presidente Mauricio Macri), mas só obteve o apoio parcial da União Cívica Radical e da Hacemos Coalición Federal (peronistas).


Esses partidos são o que a imprensa chamou de oposição "dialoguista", "aliada", "branda", "racional", "sensata", "responsável" ou "construtiva", já que querem "ajudar" o presidente, ao contrário da Unión por la Patria (peronismo/kirchnerismo) e da Frente de Izquierda, que desde o início avisaram que votariam contra.

Na semana passada, inesperadamente, Osvaldo Jaldo, governador de Tucumán, conseguiu que os três deputados que representam essa província deixassem o bloco da Unión por la Patria e formassem um grupo próprio para votar a favor da lei.

Esse foi o resultado de uma das muitas negociações realizados entre o Governo e os governadores, aos quais também ameaçou cortar fundos se não apoiassem o projeto de lei, o que causou o debate público extremamente tenso, e que finalmente se abrandou na sexta-feira com o anúncio do Ministro da Economia sobre os novos cortes dos artigos.

Dessa forma, o Governo já teve que remover os pontos mais polêmicos, como a retenção de impostos dos empresários agrícolas; a reforma eleitoral que abria as portas para o financiamento privado das campanhas e eliminava as eleições primárias para candidatos; o mecanismo de atualização das pensões; e a desregulamentação dos mercados de biocombustíveis, pesca e hidrocarbonetos.

Além disso, o Governo desistiu do desaparecimento do Fundo Nacional para as Artes (Fonca), do Instituto Nacional de Artes e Ciências Audiovisuais (Incaa), do Instituto Nacional de Música (Inamu) e da Comissão Nacional de Bibliotecas Populares (Conabip).

Resistências

Apesar dos cortes drásticos nos artigos, ainda há seções que a maioria dos deputados parece não estar disposta a endossar.

Um dos artigos mais polêmicos ainda é o que propõe a "delegação de poderes legislativos" ao Milei no âmbito da "emergência pública em assuntos econômicos, financeiros, fiscais, previdenciários, da segurança, defesa, tarifárias, energéticos, sanitários, administrativos e sociais" até 31 de dezembro de 2024, com a possibilidade de prorrogação por mais um ano.

Isso permitiria que o presidente editasse leis como quisesse nessas áreas sem a necessidade de passar pelo Congresso, o que é rejeitado por parte da oposição, apesar de o Governo já ter removido as questões previdenciárias, de defesa, sanitárias e sociais.

Outros artigos impugnados referem-se à privatização de empresas públicas ou à criminalização do protesto social, que deixaria de ser um direito constitucional e passaria a ser um crime, algo que já foi questionado até mesmo pelas Nações Unidas.

Além disso, o documento mantém a limitação do direito de greve dos funcionários públicos e os impede de serem politicamente ativos; endossa o uso abusivo de armas pelas forças de segurança  para que as vítimas de violência institucional não possam processá-los pelos abusos cometidos; reduz o imposto sobre a riqueza e abre a possibilidade de cancelar a universidade a estrangeiros.