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Aposentadorias, reforma eleitoral e 141 artigos a menos: as mudanças que Milei aceitou na "Lei Ônibus"

Entenda os embates travados entre o Governo Milei e as alas de oposição.
Aposentadorias, reforma eleitoral e 141 artigos a menos: as mudanças que Milei aceitou na "Lei Ônibus"Gettyimages.ru / NurPhoto

A oposição e a pressão social forçaram o presidente da Argentina, Javier Milei, a fazer várias alterações em sua polêmica "lei geral" na tentativa de aprová-la no Congresso, em meio a um clima de alta tensão política.

Embora o presidente tenha insistido que o projeto de lei deveria ser aprovado sem modificações para pôr fim à "decadência" da Argentina e evitar "uma catástrofe de proporções bíblicas", ele acabou se vendo obrigado a fazer concessões. Caso contrário, o projeto de lei corria o risco de ser rejeitado por completo.

Como resultado, a Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos, que ele apresentou no início de janeiro e que, devido ao seu tamanho, foi batizada de "Lei Ônibus", foi reduzida de 664 para 523 artigos.

Vários capítulos foram deixados de lado graças aos protestos dos setores prejudicados que se mobilizaram através de  reuniões com autoridades do Governo, audiências na Câmara dos Deputados e manifestações de rua.

Esse foi o caso, por exemplo, dos setores pesqueiros, e de hidrocarbonetos e biocombustíveis, que conseguiram eliminar os artigos que os afetavam. A intenção original era desregulamentar essas atividades.

Assim, às vésperas da greve nacional a ser realizada na quarta-feira, que os organizadores preveem que será massiva, o governo apresentou um novo projeto que será discutido nesta terça-feira nas comissões e depois na sessão plenária.
A "lei ônibus" é tão extensa e abrange tantas áreas que, apesar das "correções", sua aprovação ainda não está garantida devido a contestações da oposição, que alerta sobre aspectos que ainda consideram alarmantes. É o caso, por exemplo, do poder discricionário de assumir dívidas públicas sem passar pelo Congresso.



O que fica, e o que muda?

Um dos artigos mais polêmicos proíbe a reunião de mais de 30 pessoas em vias públicas sem a permissão prévia das autoridades. A minuta original limitava esse número a três, o que causou muita comoção. Embora as autoridades tenham se comprometido a removê-lo, na realidade houve apenas um aumento no número de participantes.

Para muitos críticos, as mudanças fazem com que os protestos sociais deixem de ser um direito constitucional, transformando-as em um delito.

Além disso, o documento impõe limitações ao direito de greve dos funcionários públicos e os impede de serem politicamente ativos; dificulta que vítimas de violência institucional processem as forças de segurança pelos abusos cometidos; reduz o imposto sobre a riqueza e abre a possibilidade de pagamento de taxas universitárias a estrangeiros.

Outras das mudanças mais importantes incluem o cálculo das aposentadorias, pois o governo concordou que elas devem ser ajustadas automaticamente de acordo com a inflação, seguindo exigência das alas mais moderadas de oposição. Existem ainda os opositores que alertam que, de qualquer forma, os aposentados perderão o poder de compra.

Em outro ponto, a pedido dos governadores e produtores, os impostos retidos na fonte sobre as economias regionais foram eliminados, embora um aumento seja mantido para os subprodutos da soja, trigo, milho e carne bovina.

Um dos artigos mais controversos da lei estabeleceu a declaração de "emergência pública em matéria econômica, financeira, fiscal, previdenciária, de segurança, de defesa, tarifária, energética, de saúde, administrativa e social" até 31 de dezembro de 2025, ou seja, metade do mandato de Milei, com a possibilidade de prorrogação por mais dois anos - o que cobriria todo o seu mandato.

Nesse contexto, o presidente propôs "a delegação de poderes legislativos", o que significava que, sob o pretexto da emergência, ele poderia ignorar completamente o Congresso, governar praticamente por decreto e emitir leis em todas as áreas supracitadas.

Exclusões:

O novo projeto de lei encurta esse período para um ano, com a possibilidade de prorrogação por mais um, o que continua a ser combatido por setores da oposição que avisaram desde o início que rejeitariam a "lei ônibus" em sua totalidade.

Também foi excluída do projeto de lei a reforma política que eliminou as eleições primárias para candidatos e modificou a distribuição de assentos na Câmara dos Deputados.

Outro aspecto que gerou forte resistência foi a intenção de privatizar 41 empresas. Na segunda minuta, a empresa petroleira Yacimientos Petrolíferos Fiscales (YPF) foi retirada da lista, mas foi mantida a intenção de privatizar o Banco Nación, a Aeropuertos Argentinos e a Empresa Argentina de Soluciones Satelitales (Arsat), entre outras empresas que vários deputados já haviam dito que deveriam permanecer nas mãos do Estado.

Uma das mudanças mais notáveis é que as autoridades governamentais recuaram e o Fundo Nacional para as Artes (Fonca), o Instituto Nacional de Artes e Ciências Audiovisuais (Incaa), o Instituto Nacional de Música (Inamu) e a Comissão Nacional de Bibliotecas Populares (Conabip) não serão extintos, graças ao intenso ativismo de escritores, cineastas e artistas, entre outros grupos.