Notícias

EXCLUSIVO: Luis Arce conversa com Rafael Correa após tentativa de golpe na Bolívia

Neste episódio especial de 'Conversando con Correa. Golpes de Estado', o presidente da Bolívia, Luis Arce, conversa com Rafael Correa sobre a tentativa de golpe de Estado que seu país sofreu. Esta é a primeira entrevista que ele concedeu desde o fracassado golpe militar na quarta-feira.
EXCLUSIVO: Luis Arce conversa com Rafael Correa após tentativa de golpe na BolíviaRT

Neste novo episódio especial de 'Conversando con Correa. Golpes de Estado", Rafael Correa conversa com o presidente da Bolívia, Luis Arce, sobre a tentativa de golpe de Estado que seu país sofreu na quarta-feira.

Durante a conversa, o presidente lembrou que no dia anterior à tentativa de golpe, o general Juan José Zúñiga fez declarações à mídia que "transgrediram a Constituição política do Estado", afirmando que as Forças Armadas do país não deveriam interferir nos sistemas políticos. "No dia anterior, já havíamos tomado a decisão de removê-lo do comando do Exército", disse ele.

Relembrando seu encontro com Zúñiga, Arce revelou: "Exigi que ele respeitasse esse comando e que recuasse com as tropas militares que estavam na praça Murillo. Ele se recusou. Tentei convencê-lo, mas ele se recusou".

"Imediatamente, nós [...] informamos por telefone, nos comunicando com todos, com todas as organizações, com todas as pessoas que podíamos naquele momento, sobre a situação que estávamos vivendo na Bolívia", enfatizou Arce.

Nesse contexto, ele destacou a rapidez com que o povo boliviano chegou à praça Murillo, onde os eventos ocorreram. "O povo boliviano saiu às ruas para defender a democracia", indicou o presidente.

"Em todo o país, o povo boliviano começou a se mobilizar. Eles foram para as ruas, praças, temos até vídeos em que muitas organizações, as pessoas foram para os portões e para os quartéis, para tomar os quartéis para evitar que mais militares que poderiam apoiar essa tentativa de golpe de Estado saíssem", relatou.

"Ali foi mostrado um povo boliviano totalmente comprometido com a democracia".

Arce disse que "também devemos agradecer a muitos presidentes" e organizações internacionais que demonstraram sua solidariedade com a Bolívia.

Por que a tentativa de golpe não foi consolidada?

Ao comentar por que o golpe não se consolidou, Arce declarou que "havia várias unidades do Exército que não se moveram".

"Sem dúvida, havia unidades que não responderam, ou que pelo menos demoraram a responder. E essa demora foi justamente o que causou o nervosismo das pessoas que estavam dando o golpe de Estado e as desanimou", declarou o mandatário.

Arce reiterou que "um fato fundamental" foi que "a Polícia não reagiu e, evidentemente, várias unidades, várias divisões do Exército também não atenderam a essas instruções".

Haverá uma "investigação completa"

Ao comentar por que esse golpe de Estado não foi consolidado, Arce declarou que "havia várias unidades do Exército que não se moveram".

O presidente boliviano afirmou que "é a investigação completa que temos de realizar em nosso país" para estabelecer onde estão os motivos, onde as ideias foram geradas e onde estão os autores intelectuais. "Porque esses são apenas os que operam, [...] mas alguém está por trás disso, alguém é quem financia, alguém é quem promete coisas", indicou.

"No final, os motivos por trás desse tipo de coisa sempre têm a ver com um aspecto econômico. [...] Pelo menos na história do nosso país, sempre houve algum recurso natural, algum interesse econômico por parte das oligarquias, das castas que governaram em seu momento nosso país, do qual agora querem apoderar-se também", disse ele.

De acordo com as palavras do chefe de Estado boliviano, "há um grande apoio quando o Governo inicia políticas soberanas, como a industrialização".

Ao abordar o tema dos EUA - o qual vê uma questão de sua segurança nacional em ter o controle sobre a região do "triângulo do lítio", que inclui Argentina, Bolívia e Chile - Arce destacou que "não se referiram apenas ao lítio". "No nosso caso, se referiram às terras raras, no nosso caso, se referiram ao fato de que somos a reserva de água doce", indicou, acrescentando que o país "vai entrar em uma profunda investigação para encontrar não apenas os autores materiais, mas também os autores intelectuais desse fracassado golpe de Estado".

Relembrando o golpe de Estado que ocorreu na Bolívia em 2019, Arce disse que "há diferenças". "O golpe de 2019 tem suas diferenças porque naquela época, quando o golpe de Estado ocorreu, nenhum tanque entrou na praça Murillo, nenhum soldado entrou na praça Murillo", disse ele.

"Primeiro, houve um vácuo de poder gerado pela direita para tomar o Estado e o controle do Governo e dos diferentes órgãos governamentais, mas não havia um único tanque", lembrou.

Como podemos evitar que isso aconteça novamente?

Quando perguntado sobre como evitar que isso aconteça novamente, o mandatário boliviano ressaltou que "as ambições insanas, antiéticas e imorais são o que estão conduzindo lamentavelmente a esse tipo de eventos".

"Isso é absolutamente inconcebível, o que está acontecendo. Os militares fazem um juramento perante a Constituição política do Estado para respeitá-la. E há motivos, motivos que são inclusive apetites pessoais em alguns casos; mas são ambições, ambições econômicas, ambições de poder. A ambição, lamentavelmente, aqui trabalha contra a humanidade", enfatizou.

Arce sustentou que "há um apetite voraz pelo poder em alguns casos" e "há também apetites vorazes por questões econômicas, pelo controle de certos recursos, pelo controle de certos materiais que hoje estão se tornando estratégicos e que motivam alguém a oferecer incentivos e a ir [...] esquentando os ouvidos de vários deles para que façam esse tipo de aventura que, felizmente, no nosso caso, não prosperou".

Ao mesmo tempo, ele opinou que "o sistema capitalista é um dos principais fatores que motivam tudo isso". "Tudo se torna uma mercadoria, o que [significa que] não há nem dignidade, nem patriotismo, nem princípios, nem ideologia a defender", afirmou.

"Eu creio que levará muito tempo até que tenhamos militares realmente comprometidos, não com um Governo, mas com seus povos".

  • Na quarta-feira, um grande número de militares bolivianos tomou as ruas da Praça Murillo, em La Paz, nas proximidades do Poder Executivo e do Legislativo do país, e até mesmo forçaram a entrada no palácio presidencial.
  • Em resposta a esses eventos, o presidente boliviano, Luis Arce, inicialmente denunciou "mobilizações irregulares de algumas unidades do Exército boliviano" e logo afirmou que se tratava de uma tentativa de golpe de Estado.
  • As ações dos militares geraram uma onda de repúdio internacional. Não apenas no exterior, mas também no país, a tentativa de golpe provocou indignação. Centenas de pessoas se reuniram perto do palácio presidencial para rejeitar as ações dos militares. Com cânticos, os manifestantes expressaram seu apoio ao presidente boliviano, assegurando-lhe que "ele não está sozinho".
  • Em meio a essa situação, Arce empossou um novo Alto Comando militar. José Sánchez tornou-se o novo comandante do Exército, Gerardo Sabala foi nomeado o novo chefe da Força Aérea e Wilson Guardia tornou-se chefe da 'Marinha' boliviana, denomeada "Armada".
  • Após o discurso de Arce e o juramento do novo Alto Comando Militar, as tropas que haviam chegado à praça Murillo se retiraram depois que os novos comandantes ordenaram.