O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, afirmou neste domingo (16) que a União Soviética foi a principal impulsionadora da criação do Tribunal Militar Internacional após a Segunda Guerra Mundial. Em entrevista ao documentário Nuremberg, o chanceler detalhou negociações, resistências iniciais de aliados ocidentais e o legado jurídico deixado pelos julgamentos.
Segundo Lavrov, a iniciativa de estabelecer um tribunal internacional para julgar crimes nazistas surgiu oficialmente em novembro de 1941, quando a URSS enviou a primeira nota defendendo a "inevitabilidade da punição" dos responsáveis.
O ministro afirmou que documentos semelhantes foram encaminhados em 1942 e 1943 e que, naquele mesmo ano, o governo soviético publicou uma declaração convocando outros países a cooperar na busca, captura e julgamento de criminosos de guerra.
Apesar disso, Lavrov relatou que os Estados Unidos e o Reino Unido mostraram pouco entusiasmo no início. Segundo ele, "o argumento subjacente era que se tratava de uma questão política e não deveria ser transformada em uma 'agenda judicial'". O ministro citou ainda declarações atribuídas a Franklin D. Roosevelt e Winston Churchill, que teriam defendido a execução sumária de oficiais alemães.
A mudança de postura, disse Lavrov, ocorreu gradualmente. Em outubro de 1943, uma reunião entre os ministros das Relações Exteriores dos três países, em Moscou, estabeleceu cooperação para identificar criminosos e conduzi-los à Justiça. A formalização definitiva veio em 1945, com a assinatura da carta constitutiva do tribunal em Londres.
"Os argumentos da União Soviética, principal iniciadora e força motriz por trás da criação do Tribunal de Nuremberg, foram ouvidos e aceitos. Nosso papel aqui é absolutamente inegável", afirmou.
Lavrov destacou também que a URSS atuou de forma independente desde o início, criando, em 1942, a Comissão Estatal Extraordinária para investigar crimes nazistas. O órgão reuniu provas, colheu testemunhos e organizou julgamentos em cidades como Krasnodar e Kharkov, experiência posteriormente usada em Nuremberg.
Para ele, a resistência ocidental também estaria ligada ao receio de revisitar decisões políticas tomadas antes da guerra, como o Acordo Naval entre o Reino Unido e Hitler, de 1935, e o Acordo de Munique, de 1938.
Alertas vindos da história
Ao comentar o impacto histórico do Tribunal de Nuremberg, Lavrov afirmou que os julgamentos lançaram bases fundamentais do direito internacional contemporâneo.
"A decisão do Tribunal de Nuremberg contém princípios formulados pela primeira vez durante esses julgamentos. Eles formaram a base do direito internacional moderno", disse.
Entre esses princípios, o chanceler destacou ainda a inaceitabilidade do uso da força, o caráter universal das normas humanitárias e a definição internacional de crimes como genocídio, agressão e crimes contra a humanidade.
O ministro ressaltou que a sentença estabeleceu a imprescritibilidade desses crimes e proibiu permanentemente organizações nazistas como a SS e a SD. Segundo ele, os princípios de Nuremberg influenciaram convenções da ONU, o trabalho da Comissão de Direito Internacional e decisões da Corte Internacional de Justiça.
"O princípio mais significativo da inevitabilidade da punição [...] foi formulado em escala internacional e universal", afirmou, observando que, apesar disso, partes da sentença têm sido "severamente testadas e frequentemente violadas".