A Venezuela anunciou nesta quinta-feira (13) que entregou à Secretaria-Geral da ONU uma carta para rejeitar "as reiteradas declarações parciais de seu porta-voz [Stéphane Dujarric] em relação ao deslocamento militar dos Estados Unidos" na região costeira do país caribenho.
"Diante da inação do secretário-geral para abordar este assunto, que já lhe apresentamos em múltiplas ocasiões de maneira privada, fazemos agora esta denúncia pública, com a esperança de que se ponha fim de uma vez por todas a esta prática", comunicou o representante permanente de Caracas no organismo, Samuel Moncada.
O que diz a carta?
No documento, é expressa a Guterres "profunda consternação" e "categórico repúdio" das autoridades venezuelanas "diante do que agora parece ser um assunto recorrente: os comentários tendenciosos de seu porta-voz ao abordar questões relacionadas à escalada da situação na costa da Venezuela, como resultado do deslocamento militar dos Estados Unidos no mar do Caribe e da realização de execuções extrajudiciais em águas internacionais".
Em particular, é mencionado o apelo "à distensão da situação", feito por Dujarric, dirigido "de maneira surpreendente tanto aos EUA quanto à República Bolivariana da Venezuela".
"Isso é uma grave distorção dos fatos e uma equiparação imoral entre o agressor e a vítima", apesar de o tema já ter sido tratado na reunião bilateral que Moncada manteve com Guterres em 28 de agosto.
Sobre isso, o diplomata lembrou que, naquela ocasião, Guterres lhe disse que "os comentários de seu porta-voz podem ter sido uma resposta a uma pergunta que o pegou de surpresa, motivo pelo qual teve de dar uma 'resposta diplomática padrão'", mas desde então "já ocorreram dois episódios do mesmo tipo".
"Diante disso, só podemos concluir que não se trata mais de um deslize, e sim de uma posição claramente assumida pela secretaria, sem levar em consideração, de nenhuma forma, as preocupações expressadas [pela Venezuela]", afirmou o embaixador venezuelano na ONU.
Em outro momento da carta, ele perguntou diretamente a Guterres e a Dujarric por que insistiam em "um discurso infundado, que não guarda qualquer relação com os fatos no terreno e que apenas serve à lógica de um regime belicista".
"A conduta de seu porta-voz confirma um claro padrão, no qual se ignora a causa fundamental das tensões no terreno: as ações ilegais e coercitivas do governo dos EUA como parte de um exercício destinado a destruir nossa forma republicana de governo e impor um regime fantoche", criticou.
Direito à defesa
Por outro lado, Moncada reiterou que ao seu país, assim como ao restante dos Estados soberanos, assiste o "direito legítimo" de "realizar exercícios militares dentro de seu próprio território, em resposta a uma ameaça estrangeira explícita e iminente", conforme previsto na Carta da ONU.
"Essas ações de autoproteção não podem, de modo algum, ser equiparadas às de caráter ofensivo que estão sendo realizadas atualmente pelos EUA", destacou, ao mesmo tempo em que ressaltou que "é evidente" que não é a Venezuela "quem está agravando a situação".
O representante diplomático advertiu ainda que "essa falsa paridade só acaba respaldando a agressão em curso dos EUA" contra a Venezuela, "num momento em que se esforçam para fabricar um conflito e, ao mesmo tempo, buscam questionar as medidas preventivas" adotadas por Caracas dentro de suas fronteiras, em consonância com seu "direito inerente à legítima defesa", conforme estipulado na Carta da ONU.
Exigências
Moncada exigiu que o gabinete de Guterres tome "medidas imediatas" para "esclarecer a situação, identificando sem ambiguidades a fonte da escalada e condenando o provocativo desdobramento militar norte-americano no Caribe, na região da costa da Venezuela".
Da mesma forma, as autoridades venezuelanas demandam que se exorte os EUA "a retirar imediatamente seus ativos militares da região, a cessar suas ameaças de uso da força contra a Venezuela e sua política de execuções extrajudiciais, e a adotar a diplomacia e a cooperação como os únicos meios viáveis para tratar qualquer assunto de contenção".
Por fim, pediu enfaticamente a Guterres para que "as declarações futuras do gabinete de seu porta-voz sejam imparciais, fundamentadas no direito internacional e não equiparem a vítima de agressão ao agressor".
Agressões dos Estados Unidos
- Em agosto, os Estados Unidos enviaram navios de guerra, um submarino, caças e tropas para a costa da Venezuela, alegando sua suposta disposição em combater o narcotráfico. Desde então, foram realizados vários bombardeios a supostos lanchas com drogas no mar do Caribe e no Oceano Pacífico, deixando dezenas de mortos.
- Washington acusou Maduro, sem provas ou fundamentação, de liderar um suposto cartel de drogas. As mesmas acusações infundadas foram feitas contra o presidente colombiano Gustavo Petro, que condenou os ataques mortais contra embarcações nas águas da região.
- Em meados de outubro, o presidente dos EUA, Donald Trump, admitiu ter autorizado a CIA a realizar operações secretas em território venezuelano. Em resposta, Maduro perguntou: "Alguém acredita que a CIA não opera na Venezuela há 60 anos?" "Alguém acredita que a CIA não conspira contra o comandante [Hugo] Chávez e contra mim há 26 anos?", perguntou ele.
- As ações e pressões de Washington foram classificadas por Caracas como uma agressão, que questiona a real razão por trás das operações.
- O alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, condenou os bombardeios realizados pelos EUA contra pequenas embarcações, supostamente para combater o narcotráfico, que resultaram em mais de 60 mortos. Especialistas e governos classificaram os ataques como execuções extrajudiciais. As ações e pressões de Washington foram classificadas por Caracas como uma agressão, que questiona a real razão por trás das operações.