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Uma nova Crise dos Mísseis? Especialistas alertam similaridades atuais com tensões da Guerra Fria

As ameaças de Trump à Rússia, os testes com armamentos nucleares e a tensão militar no Caribe lembram o episódio de 1962, quando o mundo esteve à beira de uma grande guerra, consideram analistas.
Uma nova Crise dos Mísseis? Especialistas alertam similaridades atuais com tensões da Guerra FriaAndrew Harnik

Após 60 anos de um momento-chave nas relações russo-americanas, o ministro das Relações Exteriores russo, Sergey Lavrov, traçou em outubro de 2022 um preocupante paralelo entre as ações de Washington diante do conflito na Ucrânia e um antecedente histórico da Guerra Fria: a Crise dos Mísseis de 1962. A pressão crescente entre os dois países no contexto ucraniano alerta analistas de política internacional e renova sua consideração aos comentários de Lavrov.

"Tal como em 1962, também agora se trata da criação de ameaças diretas à segurança da Rússia, mesmo nas nossas fronteiras. Hoje, isso está ainda mais próximo do que os mísseis 'Júpiter' localizados na Turquia", comentou o ministro na ocasião, em referência ao episódio histórico.

A recente escalada das tensões entre os Estados Unidos e a Rússia foi analisada em um artigo exclusivo à RT de Alexander Bobrov, chefe de estudos diplomáticos do Instituto de Pesquisa e Prognósticos Estratégicos da Universidade Russa da Amizade dos Povos (RUDN), onde o pesquisador traça o mesmo comparativo esboçado pelo chanceler russo.

"À primeira vista, parece que o desejo de confronto venceu o instinto diplomático. Mas se há uma lição a ser aprendida com a crise de outubro de 1962, é que os resultados só se revelam quando todos os termos da paz são finalmente definidos. Na diplomacia, chegar a esses termos pode levar dias, semanas ou anos", alertou Bobrov.

O antecedente pressagiado

Crise dos Mísseis (também conhecida como "Crise de Outubro", em Cuba ou "Crise do Caribe", na Rússia), desdobrada no mês de outubro de 1962, representa um dos maiores momentos de tensão na geopolítica do século passado, quando os Estados Unidos (EUA) e a União Soviética (URSS) chegaram à beira de uma guerra nuclear.

A tensão foi desencadeada com a instalação de mísseis americanos na Turquia, próximo à fronteira sul da URSS, levando à resposta de Moscou, que posicionou ogivas nucleares em Cuba, diante da costa da Flórida.

Entre os dias 16 e 28 de outubro, os dois lados negociaram a retirada das armas, abriram uma linha direta Washington‑Moscou e pavimentaram acordos futuros de controle de armamentos.

Durante esses 13 dias, a sensação de medo predominou, diante da ameaça à segurança mundial e da possibilidade de um confronto aberto entre as superpotências. O real conteúdo das trocas permaneceu em sigilo até muito tempo depois de passado o perigo.

Durante sua entrevista em 2022, Lavrov lembrou que a URSS não provocou confrontamentos, mas apenas respondeu às provocações americanas, referindo-se à instalação de mísseis nucleares no território turco.

Crise dos Mísseis 2.0?

Desde a cúpula de Anchorage, em 15 de agosto de 2025, as relações entre os EUA e a Rússia passaram do diálogo à tensão crescente. Poucos dias depois do encontro, a liderança ucraniana pressionou os aliados europeus e americanos, incentivando Trump a abandonar acordos preliminares com Moscou, congelar reservas russas, armar Kiev com mísseis Tomahawk e transformar o conflito em "guerra de Trump", cujas declarações, entre agosto e outubro, sinalizaram insatisfação com Putin e confiança de que a Ucrânia recuperaria o território perdido.

A avaliação sobre a cúpula foi posta em perspectiva após semanas de intensa cobertura midiática sobre o confronto político‑militar entre Moscou e Washington, que acompanhou o aumento subsequente das provocações, rememorando o alerta de Lavrov.

"Está em curso uma campanha militar para equipar a Ucrânia com todos tipos de armamento. Há conversas sérias sobre a necessidade de reforçar as capacidades nucleares da OTAN, além dos cinco países que já possuem armas nucleares táticas americanas em seu território. A Polônia está se candidatando para que os americanos também instalem suas bombas nucleares em seu território. Esta situação é muito preocupante", afirmou o ministro na mesma entrevista.

O governo russo propôs em setembro deste ano a prorrogação do Tratado New START, assinado em 2010 para limitar a proliferação de ogivas nucleares pelos dois países, marcado para expirar em fevereiro de 2026. Apesar de uma sinalização positiva de Trump em coletiva de imprensa da Casa Branca no início de outubro, o governo americano ainda não respondeu à proposta, focando em um novo acordo de defesa antimísseis ("Domo de Ouro") e envolvendo a China nas negociações nucleares.

Junto às ações do governo americano, o pedido ucraniano por mísseis Tomahawk, que só pode ser operado por pessoal americano, foi percebido como uma ameaça que apagou o último sinal de boa vontade mobilizado em Anchorage. Em 8 de outubro, o vice‑ministro russo de Relações Exteriores Serguei Riabkov, como reportado pela agência Radio RBC, alertou que os esforços da cúpula haviam sido enfraquecidos pelos apoiadores de uma "guerra até o último ucraniano", especialmente os europeus.

Em 16 de outubro, Vladimir Putin e Donald Trump tiveram a oitavamais longa conversa telefônica do ano, culminando na indicação de um possível encontro entre os presidentes em Budapeste, na Hungria. Em 31 de outubro de 2025, uma reportagem do Financial Times revelou que Trump havia cancelado a cúpula de Budapeste, revertendo a sinalização de diálogo e introduzindo novas sanções contra a Rússia, visando a Lukoil, Rosneft e suas exportações à China. As medidas foram aplicadas antes de sua reunião com Xi Jinping em Busan, na Coreia do Sul, apontando para uma retaliação a Moscou e cautela estratégica diante de relações geopolíticas com Pequim.