'Não sabia': polícia do Rio alega desconhecer corpos deixados em mata após megaoperação

Especialistas apontam contradições com a estratégia do "Muro do BOPE" e denunciam descumprimento de protocolos do STF.

A Polícia do Rio de Janeiro afirmou que "não sabia da existência" dos corpos deixados na mata após a megaoperação que resultou em 121 mortos nos complexos do Alemão e da Penha, na Zona Norte, informou o portal UOL.

A justificativa, dada pelo secretário de Segurança Pública, Victor Santos, contradiz a própria estratégia usada na ação, conhecida como "Muro do BOPE", que previa empurrar os suspeitos em direção ao alto da Serra da Misericórdia, área de mata onde os agentes do batalhão de elite estavam posicionados.

Segundo afirmou a Folha de S.Paulo, a tática colocava os alvos exatamente na rota em que havia policiais armados, que dispararam contra todos os que tentaram escapar. Moradores afirmam ter encontrado 71 corpos no local.

Já de acordo com o UOL, a área não foi isolada após os confrontos, e os próprios moradores retiraram cerca de 70 cadáveres da mata, transportando-os em carros emprestados até uma praça, onde foram enfileirados.

A Defensoria Pública do Rio pediu ao STF autorização para realizar laudos paralelos nos corpos, alegando descumprimento da ADPF das Favelas, que define regras para reduzir a letalidade policial. O órgão cita a ausência de perícia, isolamento e ambulâncias, e alerta para o risco de manipulação das evidências.

O secretário Victor Santos justificou a falta de ação alegando que "não houve tempo de atender a demanda" e que os agentes não sabiam dos mortos na mata. Santos afirmou ainda que todos os civis mortos eram criminosos, com base no "contexto", como roupas, local e horário das mortes, mesmo sem perícia concluída.

A Polícia Civil, por sua vez, abriu inquérito para investigar os moradores por "fraude processual", sob a alegação de que eles teriam retirado roupas camufladas e coletes dos corpos.

O secretário da corporação, Felipe Curi, ironizou, dizendo que os "indivíduos estavam na mata equipados, agora surgem de cueca ou short, como se tivessem atravessado um portal".

Especialistas e ex-autoridades classificaram o caso como "embaraçoso e dramático" para o governo fluminense. O coronel José Vicente da Silva Filho, ex-secretário nacional de Segurança Pública, afirmou ao portal UOL que a situação demonstra "desprezo pela lei e falta de comando das tropas".

Já a pesquisadora Cecília Oliveira, do Instituto Fogo Cruzado, chamou as imagens de crianças ajudando no resgate de "retrato brutal do colapso do Estado".

O governador Cláudio Castro defendeu a ação, dizendo não acreditar que houvesse inocentes na mata durante o confronto.

"Se houver algum erro, ele será irrisório", afirmou.

Com 121 mortos, a operação é considerada a mais letal da história do Rio de Janeiro, superando o massacre do Carandiru e a ação no Jacarezinho, em 2021.