Durante audiência pública da Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação da Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (8), representantes de instituições do Brasil e da China destacaram a importância de fortalecer a cooperação tecnológica entre países do Sul Global e ampliar a soberania digital frente à dependência de potências ocidentais.
Participando por videoconferência, o professor Yodan Xiao, do Instituto de Ciência e Desenvolvimento da Academia Chinesa de Ciências, afirmou que a "construção de uma nova arquitetura digital multipolar é essencial" para reduzir a vulnerabilidade tecnológica de nações emergentes.
Segundo ele, os padrões que regem o espaço digital global "frequentemente têm pouca participação do Sul Global", o que leva à adoção de modelos "que não estão alinhados com os contextos locais".
Nesse contexto, Xiao defendeu o fortalecimento da infraestrutura digital dentro do BRICS, ressaltando que "a soberania digital não é um conceito abstrato, mas uma capacidade essencial para a autodeterminação na era digital".
O professor também mencionou o papel das leis de proteção de dados e cibersegurança na China, e apontou que até 2027 o país pretende concluir um projeto de inteligência artificial voltado a aplicações sustentáveis na agricultura, saúde e serviços públicos.
Para ele, "a soberania no mundo globalizado depende de parcerias multilaterais e de confiança entre as nações do Sul Global".
A autonomia tecnológica do Brasil
A presidente do Fórum para Tecnologia Estratégica dos BRICS+, Isabela Rocha, destacou a soberania tecnológica como um ato de "defesa cognitiva", afirmando que desenvolver soluções a partir dos próprios valores e línguas é fundamental.
"O fato de que nós temos uma dependência tecnológica é uma agenda política estrangeira imposta sobre nós", enfatizou.
Segundo ela, o fortalecimento do bloco representa "a saída para a autonomia tecnológica brasileira".
Autonomia x Vulnerabilidade
Já Luan Scliar, representante do Instituto de Intercâmbio Cultural e Desenvolvimento Econômico dos Países BRICS (iBRICS+), abordou exemplos de perda de autonomia nacional em áreas estratégicas.
Ele relembrou o caso de 2013, quando os vazamentos de Edward Snowden revelaram espionagem norte-americana sobre autoridades brasileiras, e afirmou que o episódio "deixou claro que até mesmo as comunicações do alto escalão estavam sujeitas à vigilância externa".
Scliar também citou a venda da empresa brasileira Mectron, especializada em tecnologia de defesa, para uma subsidiária israelense em 2016, e apontou que decisões como essa "reduziram a autonomia tecnológica e criaram vulnerabilidades estruturais".
O especialista destacou ainda a migração de sistemas públicos para plataformas estrangeiras como Microsoft e Google, afirmando que, mesmo com garantias de segurança, "as empresas continuam controlando a infraestrutura física e lógica onde as informações estão armazenadas".
Ele concluiu defendeu o fortalecimento institucional do BRICS para que as parcerias multilaterais ganhem caráter vinculante, podendo assim "influenciar o desenvolvimento tecnológico interno e a formação de pessoal".
Segundo Scliar, o bloco "constitui hoje um arranjo relevante para a cooperação em ciência, tecnologia e indústria", mas ainda está em fase de consolidação.