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Putin denuncia hegemonia ocidental e diz que equilíbrio global exige papel da Rússia

No Fórum Valdai, presidente russo afirmou que sistema internacional passa por transformação e criticou sanções como tentativa fracassada de isolamento.
Putin denuncia hegemonia ocidental e diz que equilíbrio global exige papel da RússiaReprodução/Divulgação

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, participa nesta quinta-feira (2) do 22º Fórum Internacional de Discussão Valdai, que neste ano ocorre sob o tema "Um mundo policêntrico: guia do usuário".

O evento, realizado na cidade de Sochi, reúne especialistas, acadêmicos e autoridades para debater temas centrais da geopolítica global.

No discurso de abertura, Putin destacou o caráter único do Clube Valdai, que, segundo ele, se consolida como um espaço onde é possível "avaliar a situação de forma imparcial e abrangente", sem seguir os caminhos impostos pelas infraestruturas globais convencionais.

"As discussões nas plataformas de Valdai oferecem a oportunidade de registrar as mudanças. Compreendê-las. Sem dúvida", afirmou o presidente russo, que classificou como uma "particularidade" e "ponto forte" do fórum o desejo dos participantes de "olhar além dos limites".

Putin destacou que os encontros em Valdai vão além de uma tradição e representam uma ferramenta valiosa para compreender a dinâmica do mundo contemporâneo. Ele também comentou sobre o papel da internet na formação do espaço informativo atual, apontando que ela contribui para os processos em curso, com impactos positivos e negativos.

"O espaço informativo, ainda mais aqui. A internet contribui com sua parte. Boa, ruim, mas é assim", acrescentou.

O mandatário russo fez referência ao momento de incerteza vivido pela comunidade internacional, enfatizando a importância de levantar "o véu que esconde o dia de amanhã", apesar da complexidade do cenário atual. "Vivemos em uma época em que tudo muda e muda", disse.

Putin também refletiu sobre as características do momento atual no cenário global, classificando-o como um "espaço criativo para a conduta externa", marcado pela ausência de determinações rígidas.

"Praticamente nada é predeterminado. Tudo pode acontecer. De maneiras diferentes", disse.

Para o presidente russo, os desdobramentos geopolíticos hoje dependem diretamente do grau de resistência, precisão e ponderação dos atos de cada ator envolvido.

Segundo ele, esse novo panorama abre caminhos, mas também riscos. "É claro que é fácil se perder, perder o rumo. O que, como vemos, acontece com bastante frequência", acrescentou. Putin destacou, ainda, o avanço da multipolaridade como uma realidade do espaço internacional atual.

O presidente russo apontou o caráter dinâmico das transformações atuais, destacando que muitas vezes elas ocorrem de forma súbita. "As mudanças ocorrem rapidamente, às vezes de forma repentina. Simplesmente da noite para o dia", disse.

Putin pontuou que, diante desse cenário, preparar-se com antecedência torna-se difícil e, em certos casos, até impossível.

"É preciso reagir instantaneamente, por assim dizer. Em tempo real", observou. Entretantao, acrescentou que esse ambiente instável também carrega um aspecto positivo, por ser "muito mais democrático", abrindo possibilidades e caminhos para um número maior de participantes no sistema internacional.

Putin afirmou que o modelo internacional baseado na submissão da maioria à minoria está em declínio.

Ele pontou que talvez nunca tenha havido, na arena internacional, tantos atores influentes ou aspirantes ao papel de protagonistas regionais e globais como há hoje.

Para ele, esse cenário revela uma nova realidade civilizacional, na qual as especificidades culturais e históricas de cada país exigem a busca por pontos de contato e interesses comuns.

"Ninguém mais está disposto a jogar de acordo com as regras estabelecidas por alguém e em algum lugar distante", disse, em crítica às estruturas de poder tradicionais.

Segundo o presidente russo, quaisquer decisões relevantes hoje só podem ser tomadas com base em acordos que satisfaçam ao menos a maioria dos envolvidos, caso contrário, resultam apenas em retórica e disputas improdutivas.

"Para alcançar o resultado, é necessária harmonia. Equilíbrio", afirmou. Ele alertou ainda que, embora a multipolaridade represente uma liberdade e oportunidade para todos, os riscos também são elevados.

"Tal situação no planeta é um fenômeno de qualidade realmente novo", disse Putin, apontando que a atual transformação radical das relações internacionais é, paradoxalmente, uma resposta direta às tentativas frustradas de manter uma hegemonia global. "O fracasso dessa ideia foi... apenas uma questão de tempo", concluiu.

O presidente russo também comentou sobre o papel das Nações Unidas, reconhecendo suas limitações, mas reforçando sua importância atual. "Há muitos problemas com a ONU, mas até o momento não existe nada melhor do que a ONU", acrescentou Putin, ao defender que a organização ainda é o principal instrumento de diálogo internacional.

Sobre as declarações recentes do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em relação ao conflito na Ucrânia, Putin concordou com o mandatário norte-americano. "Permitam-me retomar o que disse o presidente Trump: ele afirmou que, se estivesse no poder, isso poderia ter sido evitado. Concordo com ele".

O presidente russo também afirmou que a estabilidade internacional não pode ser alcançado sem a presença da Rússia. "Nem econômico, nem estratégico, nem cultural, nem logístico, nenhum".

Segundo ele, os que tentaram eliminar esse papel russo acabaram por reconhecer sua importância. "Alguns ainda insistem em conseguir o que querem, causar à Rússia, como dizem, uma derrota estratégica", observou.

No entanto, o presidente russo demonstrou confiança de que a realidade acabará prevalecendo. "Se eles não veem a futilidade desse plano, persistem, mas ainda assim esperam que a vida mostre e que isso chegue até os mais teimosos", concluiu.

Putin afirmou que a Rússia demonstrou uma capacidade de resistência excepcional diante das pressões externas.

"A Rússia demonstrou ao mundo um nível de resiliência sob pressão tão alto que poderia ter desmantelado uma coalizão inteira de Estados", declarou. Segundo ele, esse desempenho evidencia que as tentativas de enfraquecer o país falharam, mesmo sob uma ofensiva sem precedentes no campo econômico e político.

Putin disse, ainda, que a Rússia se tornou alvo da maior campanha de sanções da história contemporânea, classificando as medidas como ineficazes. 

"Em termos de quantidade e volume das medidas punitivas impostas contra nós, que timidamente chamam de sanções, a Rússia é a recordista absoluta na história mundial", declarou.

Ele questionou, ainda, os resultados dessas ações: "E daí? Conseguiram o que queriam? Acho que não é necessário explicar aos presentes aqui que esses esforços fracassaram completamente".

Putin criticou diretamente a forma como potências ocidentais utilizam o regime de Kiev para seus próprios interesses. "Os demais países consideram a Ucrânia apenas uma carta no seu jogo".

Segundo ele, o país é instrumentalizado por outras nações "para resolver suas tarefas geopolíticas e também para ganhar dinheiro".

O presidente russo também criticou a narrativa adotada por líderes ocidentais sobre a Rússia, classificando-a como contraditória.

"Mas é impossível acreditar nisso, mesmo que tentem convencer seu povo. Então, que tipo de pessoas são essas?", questionou. "Ou são muito incompetentes se realmente acreditam nisso, porque é impossível levar esse absurdo a sério", completou.

Em tom direto, concluiu: "Honestamente, dá vontade de dizer: acalmem-se, durmam em paz, finalmente cuidem dos seus próprios problemas. Vejam o que está acontecendo nas ruas das cidades europeias".

Putin alertou para os riscos de subestimar a postura russa diante de ameaças externas. "Se alguém quiser medir forças com a Rússia, que tente".

Ele destacou que a história do país mostra que demonstrar fraqueza é perigoso. "A fraqueza é inaceitável porque cria tentação, a ilusão de que qualquer problema conosco pode ser resolvido pela força. A Rússia nunca demonstrará fraqueza ou indecisão", declarou.

O Fórum Valdai, criado em 2004, tornou-se uma das principais plataformas de discussão sobre política internacional, com a participação regular do presidente Putin. O evento deste ano ocorre entre os dias 2 e 5 de outubro, reunindo mais de 140 especialistas de 42 países.