A cidade de São Bernardo do Campo, na região metropolitana de São Paulo, registrou um novo caso suspeito de morte por ingestão de bebida alcoólica contaminada com metanol.
De acordo com o secretário municipal de Saúde, Jean Gorinchteyn, um homem de 45 anos morreu em casa na noite de terça-feira (30), após apresentar sintomas relacionados à intoxicação. O caso ainda não foi oficialmente notificado ao governo estadual.
"Durante a noite, recebemos a informação de que um homem de 45 anos, com exposição à bebida alcoólica, evoluiu de forma súbita à morte na sua residência. É um caso altamente suspeito", afirmou Gorinchteyn à TV Globo.
Ainda segundo a Secretaria Municipal de Saúde, três pacientes com suspeita de intoxicação por metanol estão internados no Hospital de Urgência de São Bernardo.
Números atualizados: 25 casos suspeitos em SP
A Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo informou, nesta quarta-feira (1º), que o total de casos suspeitos de intoxicação por metanol subiu para 25. Desse total:
7 casos foram confirmados laboratorialmente;
18 estão em investigação;
5 óbitos estão relacionados: um confirmado e quatro sob apuração.
O óbito confirmado ocorreu na capital paulista, enquanto os demais ainda estão em análise, sendo três na capital e um em São Bernardo do Campo.
Como ocorre a falsificação das bebidas
Segundo o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, criminosos reutilizam garrafas de marcas conhecidas de bebidas alcoólicas, como gin e vodka, para comercializar produtos adulterados com metanol.
Em entrevista coletiva, ele afirmou que mais de 50 mil garrafas e cerca de 15 milhões de selos fiscais falsificados foram apreendidos em operações realizadas nos últimos dias.
O governo estadual também determinou a interdição cautelar de bares, adegas e distribuidores suspeitos.
Segundo o delegado-geral da Polícia Civil, Artur Dian, cinco inquéritos foram instaurados e pelo menos quatro distribuidoras foram identificadas como suspeitas. Ainda segundo a Secretaria de Segurança Pública, mais de 800 garrafas foram apreendidas entre os dias 29 e 30 de setembro.
Interdições e operações em bares e comércios
As Vigilâncias Sanitárias do estado e do município de São Paulo, com apoio da Polícia Civil, interditaram ao menos três bares nos bairros dos Jardins e Mooca, na capital, e em São Bernardo do Campo.
Em todos os locais foram apreendidas garrafas de bebidas sem rótulo ou sem comprovação de procedência. A interdição é cautelar e os materiais estão sob análise do Instituto de Criminalística.
Outros estabelecimentos, como um minimercado no Planalto Paulista e uma distribuidora na região do M’Boi Mirim, também tiveram atividades de venda de bebidas suspensas.
Ao todo, mais de 40 garrafas de bebidas diversas, como gin, vodka e uísque, foram apreendidas nesses locais. Dois estabelecimentos foram autuados por infrações sanitárias. As informações foram divulgadas pela Agência SP, órgão de comunicação oficial do Governo de São Paulo.
O Governo de São Paulo criou um gabinete de crise com participação das secretarias de Saúde, Justiça, Segurança Pública, Desenvolvimento Econômico, Fazenda e Procon-SP.
O grupo está coordenando medidas emergenciais, como a interdição cautelar de estabelecimentos, orientação à rede hospitalar e abertura de canais de denúncia.
Reunião com setor privado
O governo estadual também se reuniu com representantes da Abrasel, Apas, Fhoresp e Procon-SP para discutir medidas conjuntas de combate à adulteracão de bebidas.
Segundo o secretário de Desenvolvimento Econômico, Jorge Lima, foi criado um grupo de trabalho para elaborar um documento técnico a ser entregue ao governador com propostas de ação e fiscalização.
Investigação federal
Em pronunciamento em Brasília na última terça (30), o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, informou que a Polícia Federal abriu inquérito para apurar a origem do metanol usado nas bebidas e a possibilidade de uma rede de distribuição com atuação em outros estados.
O Ministério da Saúde informou, por meio de nota técnica, divulgada nesta quarta-feira (1º), que enviou orientações a todos os estados e municípios do país para a notificação imediata de casos suspeitos de intoxicação por metanol.
Segundo a pasta, a situação é considerada um Evento de Saúde Pública (ESP), exigindo ampliação da vigilância e resposta rápida dos serviços de saúde.
A nota orienta sobre definição de caso, sintomas clínicos e protocolos de conduta, além de destacar o uso do etanol puro como antídoto hospitalar. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, reforçou que as suspeitas devem ser comunicadas de forma imediata ao Centro Nacional de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (CIEVS) estadual.
Vítimas e sequelas graves
Entre os casos que mais chamaram atenção está o de Radharani Domingos, de 43 anos. Segundo entrevista concedida ao programa Fantástico, da TV Globo, ela ficou cega após consumir três caipirinhas com vodka em um bar no Jardim Paulista. A paciente chegou a ter convulsões e precisou ser intubada na UTI.
Outro caso é o de Rafael Anjos Martins, de 28 anos, que está em coma desde 1º de setembro, após ingerir gin comprado em uma adega na Zona Sul da capital. Segundo a mãe dele, Rafael não apresenta fluxo sanguíneo cerebral e respira por aparelhos.
O advogado Marcelo Lombardi, de 45 anos, também morreu após parada cardiorrespiratória. O atestado de óbito registrou intoxicação por metanol.
O que é o metanol
De acordo com especialistas do Centro de Informação e Assistência Toxicológica (CIATox) da Unicamp, o metanol é um álcool simples, altamente tóxico, inodoro e incolor. Ele é utilizado legalmente na indústria para fabricação de tintas, solventes, plásticos, combustíveis e biodiesel.
No corpo humano, o metanol é convertido pelo fígado em formaldeído e depois em ácido fórmico, o verdadeiro responsável por sequelas graves, como:
Acidose metabólica severa;
Danos ao nervo óptico (cegueira);
Falência renal, hepática e pulmonar;
Coma e morte.
Sintomas e primeiros sinais
Segundo o CIATox e a Sociedade Brasileira de Patologia Clínica, os sintomas iniciais da intoxicação por metanol aparecem entre 10 e 48 horas após o consumo e podem incluir:
Dor de cabeça intensa;
Visão borrada ou turva;
Náuseas e vômitos;
Dor abdominal e tontura;
Confusão mental;
Convulsões e coma.
Atendimento e tratamento
De acordo com o secretário estadual da Saúde, Eleuses Paiva, todas as unidades hospitalares estão preparadas para o atendimento de casos suspeitos.
"Se for no início, o antídoto resolve plenamente. Dependendo, pode ser necessário hidratação e medicamentos para acidose metabólica. O importante é tratar o mais rápido possível", disse Paiva.
O tratamento inclui:
Diagnóstico laboratorial com gasometria, osmolaridade sérica e dosagem de metanol;
Hemodiálise para remoção do metanol e ácido fórmico;
Uso de etanol puro como antídoto emergencial;
Fomepizol, antídoto mais eficaz, mas indisponível no Brasil.
O Estado de São Paulo conta com três laboratórios (em Campinas, Botucatu e Ribeirão Preto) que realizam análises com resultados em até uma hora.
O que dizem as entidades
A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) classificou a falsificação como um crime grave contra o consumidor e cobrou fiscalização mais rigorosa em distribuidoras e pontos de venda. A entidade orienta bares a inutilizarem as garrafas vazias para evitar seu reaproveitamento.
O que falta esclarecer
A origem exata do metanol utilizado nas bebidas adulteradas;
Se existe uma rede nacional ou interestadual de distribuição clandestina;
A responsabilidade criminal dos estabelecimentos envolvidos;
O envolvimento de organizações criminosas na falsificação.
As investigações continuam sendo conduzidas pela Polícia Civil, Polícia Federal, Ministério da Justiça e autoridades sanitárias.
Como denunciar
A população pode denunciar irregularidades de forma anônima pelos seguintes canais:
Disque Denúncia 181 (Polícia Civil);
Site da Polícia Civil: www.webdenuncia.sp.gov.br;
Procon-SP: telefone 151 ou www.procon.sp.gov.br.