Governo brasileiro prepara dois projetos de lei para regulamentar big techs

Propostas focam na regulação do conteúdo nas plataformas digitais e práticas econômicas de gigantes como Google e Amazon.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu encaminhar ao Congresso dois projetos de lei que estabelecem regras para o funcionamento das big techs no Brasil, divulgou a imprensa nesta terça-feira (19).

Um dos textos trata da regulação de conteúdo nas plataformas digitais, enquanto o outro se debruça sobre práticas econômicas consideradas desleais por empresas do setor. A previsão é de que os projetos sejam enviados na próxima semana.

A proposta que regula o conteúdo foi desenvolvida pelo Ministério da Justiça em conjunto com a Secretaria de Comunicação Social (Secom). Já o texto com foco na regulação econômica é resultado do trabalho do Ministério da Fazenda.

Ambos os projetos foram discutidos internamente e devem ser articulados com os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB).

Lula definiu que os textos só serão formalmente apresentados após a Câmara concluir a votação do projeto da "adultização", que cria medidas de proteção para crianças e adolescentes na internet. A expectativa é que essa pauta seja votada ainda nesta semana.

Regras para plataformas com mais de 3 milhões de usuários

O projeto que trata da regulação de conteúdo mira as plataformas digitais com mais de três milhões de usuários. Empresas menores também terão obrigações, como a criação de canais de comunicação com o público, mas estarão sujeitas a regras mais brandas.

O texto define que essas plataformas devem garantir mecanismos de prevenção à veiculação de conteúdos criminosos, como fraudes, crimes contra menores, incitação à violência e violações ao Código de Defesa do Consumidor.

As plataformas terão o dever de notificar e agir preventivamente, sob risco de sanções progressivas: advertência, multa e, em último caso, suspensão temporária por até 60 dias, determinada diretamente pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que será rebatizada como Agência Nacional de Proteção de Dados.

A suspensão maior do que esse prazo dependerá de decisão judicial. A ANPD, no entanto, não atuará fiscalizando conteúdo individualmente, mas fará análises do comportamento das plataformas como um todo.

Dispositivos sobre proteção a menores e influenciadores

Embora contenha pontos semelhantes ao PL 2628/2022 de autoria do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que trata da "adultização" digital, o governo optou por manter os trechos relacionados à proteção de menores. A ideia é que o Congresso promova os ajustes necessários, integrando as propostas.

O projeto também determina que as plataformas devem informar, com clareza, os critérios para monetização de conteúdo e justificar decisões como suspensões ou bloqueios de contas.

Segundo o governo, influenciadores de diferentes espectros ideológicos têm sido penalizados sem explicações claras por parte das empresas.

Exclusão de crimes contra honra e "fake news"

O texto não inclui crimes contra a honra – como calúnia, injúria e difamação – entre os conteúdos passíveis de remoção sem decisão judicial. Tampouco menciona a obrigatoriedade de combate à desinformação. Segundo o governo, essas questões estão em "zona cinzenta" e devem ser tratadas exclusivamente pelo Judiciário.

A proposta segue o entendimento do Supremo Tribunal Federal, que decidiu que as plataformas digitais não são obrigadas a remover esse tipo de conteúdo sem ordem judicial.

Regulação econômica mira big techs do Vale do Silício

O segundo projeto tem foco econômico e é direcionado às chamadas "big five": Alphabet (Google), Amazon, Apple, Meta* e Microsoft. Segundo o governo, essas empresas adotam práticas anticoncorrenciais que afetam a competitividade e encarecem serviços para os consumidores.

Entre os alvos da proposta estão a cobrança de taxas consideradas abusivas em lojas de aplicativos, a venda casada de serviços e o direcionamento nos meios de pagamento.

A nova legislação prevê a criação de uma Superintendência de Mercados Digitais no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que será responsável por instruir processos e propor sanções específicas para cada empresa.

O Ministério da Fazenda conduziu, ao longo dos últimos dois anos e meio, um estudo comparativo com legislações internacionais e dialogou com representantes do setor e autoridades regulatórias de outros países.

Segundo avaliação interna, informou a Globo News, a legislação atual não fornece instrumentos suficientes para que o Cade atue com eficácia diante das estratégias de dominação de mercado praticadas por essas empresas.

*Classificada na Rússia como uma organização extremista, cujas redes sociais são proibidas em seu território.