
STF entra em reta final no julgamento de Bolsonaro; entenda as acusações

O Supremo Tribunal Federal (STF) vive nesta terça-feira (29) um marco processual importante na ação penal que investiga a trama golpista de 2022.
Após o encerramento da fase de depoimentos de todos os acusados nos quatro principais núcleos da investigação, foi oficialmente encerrada a instrução processual dos núcleos 1, 2, 3 e 4.

O último grupo a ser ouvido foi o do núcleo 3, que inclui militares acusados de planejar ações táticas para efetivar o plano golpista, entre elas o monitoramento do ministro Alexandre de Moraes e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A partir de agora, os réus do núcleo 3 têm prazo de cinco dias para apresentar requerimentos complementares ou solicitar novas diligências. Encerrada essa fase, ou caso não haja requerimentos, inicia-se o prazo de 15 dias para que as defesas apresentem suas alegações finais.
Nesta terça-feira, portanto, inicia-se o período para a defesa do tenente-coronel Mauro Cid, salvo se forem requeridas diligências. O prazo para as alegações finais da defesa de Jair Bolsonaro ainda não começou a contar; ele será aberto somente após a manifestação de Cid.
Os processos penais estão organizados em cinco núcleos, e tramitam simultaneamente no STF. O caso mais avançado é o do chamado Núcleo 1, considerado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) como o "núcleo crucial" da articulação golpista.
Linha do tempo processual
Desde maio, a fase de instrução processual incluiu oitiva de testemunhas de defesa e acusação. Em seguida, vieram os interrogatórios dos réus. Mauro Cid foi o primeiro a ser ouvido, em razão de seu acordo de delação premiada com a Polícia Federal.
O ciclo de depoimentos se encerrou na segunda-feira (28), com os réus do Núcleo 3, formado majoritariamente por militares das Forças Especiais, conhecidos como "kids pretos".
Ao todo, o STF interrogou 31 réus. Com o encerramento dos interrogatórios, a instrução dos núcleos 1, 2, 3 e 4 foi oficialmente concluída.
O que está em julgamento: os cinco núcleos
Núcleo 1 – Núcleo crucial
Composto por oito réus, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro, esse núcleo é apontado pela PGR como o centro da organização criminosa.
A PGR afirma que Bolsonaro "figura como líder da organização criminosa, ou seja, o principal articulador, maior beneficiário e autor dos mais graves atos executórios voltados à ruptura do Estado Democrático de Direito".
Em outra parte das alegações, o procurador-geral Paulo Gonet destacou: "Sua liderança sobre o movimento golpista, o controle exercido sobre os manifestantes e a instrumentalização das instituições estatais, para fins pessoais e ilegais, são elementos que provam, sem sombra de dúvida, a responsabilidade penal do réu".
Este é o núcleo com processo mais avançado. A PGR já apresentou o pedido de condenação e faltam, agora, as manifestações de Mauro Cid e das demais defesas. A expectativa é que o julgamento ocorra em setembro, na Primeira Turma do STF, formada por Alexandre de Moraes (relator), Flávio Dino, Cristiano Zanin, Cármen Lúcia e Luiz Fux.
Núcleo 2 – Gerência das ações
Reúne seis réus, entre eles o ex-diretor da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Vasques. São acusados de coordenar ações operacionais da tentativa de golpe. Após os interrogatórios, o processo encontra-se na etapa de diligências complementares.
Núcleo 3 – Ações coercitivas
Formado por dez réus, incluindo militares da ativa e da reserva do Exército e um agente da Polícia Federal. Segundo a PF, o grupo planejou o assassinato de autoridades como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes. O plano, batizado de "Punhal Verde e Amarelo", previa execuções em 15 de dezembro de 2022.
Entre os nomes estão o general Estevam Gaspar de Oliveira, o tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira e o coronel Bernardo Romão Corrêa Netto.
Os crimes atribuídos a esse grupo incluem:
- organização criminosa armada;
- tentativa de abolição violenta do Estado;
- Democrático de Direito;
- golpe de Estado;
- dano qualificado pela violência;
- grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.
Núcleo 4 – Estratégias de desinformação
Sete réus compõem este núcleo, a maioria também militares. São responsabilizados pela propagação de narrativas falsas como parte do plano golpista. O processo aguarda a conclusão de diligências adicionais, como novos laudos e perícias.
Um dos depoimentos mais relevantes dessa etapa foi do general Mario Fernandes, ex-assessor de Bolsonaro, que admitiu ter elaborado um plano para matar Lula, Alckmin e Moraes. Segundo ele, "o plano não seria colocado em prática".
Núcleo 5 – Propagação de desinformação
Esse processo corre de forma mais isolada e tem apenas um réu: Paulo Figueiredo Filho. O STF autorizou a retomada da tramitação após notificação por edital. O próximo passo é a análise da admissibilidade da denúncia.
Revelações dos depoimentos
Um dos momentos centrais do processo foi a delação do tenente-coronel Mauro Cid. Ele afirmou que Bolsonaro recebeu e alterou pessoalmente uma minuta de decreto de Estado de Defesa, com previsão de prisão de autoridades. Segundo Cid, o presidente "manteve apenas o nome de Alexandre de Moraes como alvo".
Cid também relatou que o general Walter Braga Netto lhe entregou uma caixa de vinho com dinheiro em espécie, destinado ao major Rafael Martins de Oliveira, ligado ao grupo acusado de planejar os atentados.
Durante os interrogatórios, o ex-ministro da Defesa Almir Garnier confirmou que participou de uma reunião com Bolsonaro no Palácio da Alvorada sobre possível decretação de GLO, mas negou ter colocado as tropas da Marinha à disposição.
Já o general Augusto Heleno respondeu apenas às perguntas de seu advogado e afirmou que o ex-presidente sempre disse que atuaria "dentro das quatro linhas da Constituição".
O inquérito também aponta que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), sob o comando do GSI durante o governo Bolsonaro, foi utilizada como parte do plano golpista. A PF identificou seu uso como instrumento de monitoramento e inteligência paralela.
Relembre os atos de 8 de janeiro
Em 8 de janeiro de 2023, manifestantes contrários ao resultado das eleições invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília. A investigação da PF identificou vínculos entre os organizadores desses atos e os núcleos investigados por tentativa de golpe de Estado.
Mais de 1.800 pessoas foram detidas. Bolsonaro passou a ser investigado após a identificação de declarações e comportamentos considerados incitadores.
Expectativas e próximos passos
A expectativa é que as primeiras sentenças sejam proferidas ainda no segundo semestre deste ano. Após o encerramento do período de diligências e das alegações finais, os casos mais avançados, como o do Núcleo 1, devem ser levados a julgamento na Primeira Turma do STF.
As decisões poderão resultar em condenações com definição de penas ou absolvições. Em qualquer dos cenários, cabem recursos dentro da própria Corte. Em caso de trânsito em julgado, a pena pode ser executada imediatamente.


