
Jovem brasileiro que morreu lutando pela Ucrânia foi aliciado e enganado pelas redes sociais

Aos 21 anos, Gabriel Pereira saiu de Belo Horizonte rumo ao Leste Europeu sem aviso prévio à família, sem análise de riscos e com destino oculto.
A decisão foi tomada após o jovem ser atraído por páginas do Instagram* que oferecem instruções em português para se alistar junto às forças armadas da Ucrânia.
"O que a gente acredita é que ele foi aliciado por meio dessas páginas nas redes sociais, que prometem salário de até 25 mil reais, seguro de vida e ajuda de custo", relatou o irmão, Gustavo Alves Ferreira, em entrevista exclusiva à RT Brasil.
Entre os perfis identificados, está o Foreign Recruitment Center, que publicou um vídeo detalhado sobre o passo a passo para adesão: da recepção de links via WhatsApp até o envio de documentos pessoais, como passaporte e certificados profissionais. Em português claro, o vídeo orienta:
"Olá, tudo bem? Hoje vamos mostrar o passo a passo de como você fará o seu cadastramento para se juntar às forças de defesa da Ucrânia".
A sequência inclui sete etapas, que envolvem o preenchimento de formulários online e o envio de arquivos em formatos como JPG ou PDF. "Pedimos que tenham um pouco de paciência, mas todas serão atendidas", conclui o vídeo, que termina com a frase "Slava Ukranian" (Glória à Ucrânia, em português).

Gabriel embarcou com recursos próprios e usou um álibi para ocultar o real motivo da viagem. Disse aos familiares que tentaria a sorte na Legião Estrangeira Francesa. Mas logo deixou escapar a verdade.
"Ele chegou a comentar com amigos que ia entrar para a Legião Estrangeira Francesa. Mas na verdade, quando questionamos, ele acabou deixando escapar que estava na Ucrânia. Ele não sabia nem qual era a moeda da França e falou da grívnia", revelou Gustavo.
A descoberta oficial veio por meio de um detalhe técnico: "Ele pegou um Uber da Polônia para a Ucrânia, e o e-mail cadastrado era o da minha mãe", contou o irmão.
Segundo Gustavo, Gabriel foi instruído a ocultar a decisão dos familiares. "Muito provavelmente pedem para que eles omitam as informações porque sabem que os familiares vão ser prontamente contra essa decisão", afirmou.
Ao cruzar a fronteira, Gabriel teve os documentos retidos e foi levado a um centro de treinamento com outros estrangeiros. A barreira do idioma foi imediata:
"Esses documentos [contrato assinado] estão na língua ucraniana. Os meninos estavam me contando, me falando, eles chegam lá, pegam o celular mesmo para traduzir. Eles abrem a câmera, pegam o tradutor do celular para traduzir os termos do contrato", explicou.
Sem tradutores oficiais ou explicações detalhadas, os combatentes estrangeiros assinam os termos baseados apenas em traduções automáticas. "Mesmo que ele se arrependa, chegando lá, ele não tem o que fazer. Ele não tem como voltar, ele não tem emprego. Ele vai ter que assinar o contrato se ele quiser comer", disse Gustavo.

A promessa de estabilidade financeira se mostra ilusória. "O dinheiro que ele ganha lá ele gasta lá mesmo. Comida, uniforme, equipamentos, transporte. A economia gira dentro do país. Ele não teve condição de mandar um centavo pra casa", relatou.
A realidade, segundo o irmão, é uma armadilha com aparência de oportunidade: "A facilidade é chegar lá e assinar o contrato. Depois que você assinou o contrato, a vida é nua".
Gabriel morreu pela Ucrânia. A informação chegou à família por canais informais, sem qualquer comunicação oficial ou documentação que comprove o falecimento. Até o momento, os parentes não receberam certidão de óbito nem esclarecimentos por parte de autoridades brasileiras ou ucranianas.
*Classificada na Rússia como uma organização extremista, cujas redes sociais são proibidas em seu território.
