O confronto entre Israel e a República Islâmica do Irã, alimentado há mais de quatro décadas por disputas estratégicas, operações clandestinas e guerras por procuração, escalou para o campo aberto em junho de 2025.
Bombardeios aéreos em Teerã, ofensivas com mísseis contra Tel Aviv e a destruição de infraestruturas militares e nucleares marcam uma nova fase no embate que, segundo autoridades ocidentais e fontes regionais, ameaça desestabilizar todo o Oriente Médio.
A seguir, entenda a cronologia de eventos que levaram ao estágio atual do conflito.
1948 a 1979: Reconhecimento inicial e alianças discretas
O conflito entre Israel e a República Islâmica do Irã remonta a 1979, quando a Revolução Islâmica depôs o Xá Mohammad Reza Pahlavi e instaurou o governo liderado pelo aiatolá* Ruhollah Khomeini.
As relações entre Israel e o Irã foram cordiais até 1979. Embora tenha se oposto à partilha da Palestina que levou à criação de Israel em 1948, o Irã foi o segundo país islâmico a reconhecer o Estado israelense, após o Egito.
Durante o reinado dos Xás da dinastia Pahlavi, a monarquia iraniana mantinha aliança estratégica com os Estados Unidos; Israel buscava sua aproximação como forma de isolar a rejeição de seus vizinhos árabes.
Durante boa parte do século XX, Irã e Estados Unidos mantiveram uma relação amistosa. Na década de 1950, com o acirramento da Guerra Fria, Washington passou a contar com o apoio do Xá iraniano para conter a expansão da influência soviética no estratégico Oriente Médio, rico em petróleo.
No entanto, o Xá enfrentava crescente rejeição interna. Em 1953, com o apoio da CIA, um golpe derrubou o então primeiro-ministro Mohammed Mossadegh, líder popular que havia nacionalizado a companhia petrolífera britânica no país e defendia uma posição mais neutra diante do conflito entre as grandes potências.
A situação mudou drasticamente em 1979, quando uma revolução derrubou o Xá. Os novos líderes islâmicos acusaram a CIA de ter treinado a temida polícia secreta do regime anterior e passaram a combater o que chamavam de imperialismo ocidental, rotulando os EUA como "o Grande Satã".
Nesse contexto, estudantes revolucionários invadiram a embaixada americana, mantendo dezenas de diplomatas e funcionários como reféns por mais de um ano, episódio que marcou o fim da aliança estratégica entre os dois países e alterou profundamente a geopolítica da região.
Desde então, Irã e EUA se enfrentam indiretamente por meio de operações de inteligência, apoio a grupos armados e disputas por influência regional.
Com a Revolução Islâmica, liderada por Ruhollah Khomeini em fevereiro de 1979, o Irã também rompeu relações com Israel, revogou a validade dos passaportes israelenses e entregou a embaixada de Tel Aviv em Teerã à Organização para a Libertação da Palestina (OLP).
O Irã passou a se projetar como potência pan-islâmica e adotou a causa palestina como central, o que se materializou em grandes manifestações anuais organizadas oficialmente em Teerã. O país persa passou, então, a tratar o país como "inimigo sionista".
Consolidação da guerra por procuração nos anos 2000
A rivalidade com Israel evoluiu o que foi descrito como uma "guerra nas sombras". O Irã, percebendo seu isolamento no mundo árabe sunita, criou uma rede de grupos armados alinhados a seus interesses, o chamado "Eixo da Resistência", com presença no Líbano, Síria, Iraque e Iêmen.
A principal dessas forças é o Hezbollah, grupo libanês apoiado por Teerã e classificado como organização terrorista pelos Estados Unidos e pela União Europeia.
Israel respondeu com operações de inteligência, ataques seletivos e apoio a milícias hostis ao Irã, em especial na Síria e no Líbano. A atuação mútua raramente era reconhecida em caráter oficial, consolidando a dinâmica encoberta do conflito.
Em 1992, um atentado com carro-bomba contra a embaixada de Israel em Buenos Aires, atribuído ao grupo Jihad Islâmico vinculado ao Irã, matou 29 pessoas. O episódio ocorreu pouco após o assassinato do líder do Hezbollah, Abbas al-Musawi, atribuído ao serviço secreto israelense (Mossad).
2010: ataque cibernético paralisa programa nuclear iraniano
Em junho de 2010, o Irã sofreu um dos ataques cibernéticos mais sofisticados da história recente. O vírus Stuxnet, desenvolvido por Israel em parceria com os Estados Unidos, segundo o jornal The New York Times, causou danos significativos às centrífugas de enriquecimento de urânio na instalação de Natanz, atrasando o programa nuclear iraniano.
Com o início da guerra civil na Síria, em março de 2011, o Irã passou a apoiar ativamente o governo de Bashar Al-Assad com armas, dinheiro e consultores militares. A inteligência israelense considera a Síria uma das principais rotas de envio de armamentos iranianos para o Hezbollah no Líbano.
De acordo com o portal de inteligência e centro de análises americano Stratfor, tanto Israel quanto o Irã conduziram operações em território sírio com o objetivo de dissuadir o outro de lançar um ataque em escala total.
2015 a 2018: acordo nuclear e retração diplomática
Em julho de 2015, o Irã assinou com seis potências globais o Plano de Ação Conjunto Global (Joint Comprehensive Plan of Action, em inglês), suspendendo parte de seu programa nuclear em troca da retirada de sanções.
Três anos depois, em maio de 2018, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, retirou o país do acordo, impondo novamente sanções severas. O gesto foi apoiado por Israel, segundo reportagem da Reuters, que considerava o pacto ineficaz.
Começo dos anos 2020
Durante a década, diversos cientistas nucleares iranianos foram assassinados. O caso mais emblemático ocorreu em 27 de novembro de 2020, quando Mohsen Fakhrizadeh, considerado o principal responsável pelo programa atômico do Irã, foi morto em Teerã. O governo iraniano acusou Israel de envolvimento, mas Tel Aviv não assumiu responsabilidade.
Segundo o The Guardian, o ataque foi atribuído ao serviço de inteligência israelense (Mossad). A morte acentuou as tensões entre os dois países.
Em 2021, a "guerra nas sombras" se expandiu para o mar. Israel acusou o Irã de atacar navios de bandeira israelense no Golfo de Omã. Teerã, por sua vez, responsabilizou Israel por danos em embarcações iranianas no Mar Vermelho.
2023: ataque do Hamas e fortalecimento da retórica iraniana
Em 7 de outubro de 2023, o Hamas lançou uma ofensiva contra o território israelense a partir da Faixa de Gaza.
O ataque provocou uma reação militar intensa por parte de Israel, com bombardeios em larga escala sobre o enclave palestino. Diante do agravamento do conflito, surgiram tensões crescentes em toda a região, com temores de um confronto direto entre Israel e o Irã.
Embora tenha negado participação direta na ofensiva, o Irã reafirmou seu apoio ao Hamas e passou a adotar uma postura ainda mais hostil em relação a Israel. Autoridades iranianas intensificaram o envio de armamentos tanto para a Faixa de Gaza quanto para o sul do Líbano, ao mesmo tempo em que elevaram o tom do discurso político contra o Estado israelense.
A escalada de 2024: ataques diretos e ações coordenadas
Em 1º de abril de 2024, um ataque aéreo israelense atingiu o consulado iraniano em Damasco, na Síria, e matou altos comandantes da Guarda Revolucionária do Irã, incluindo o general Mohammad Reza Zahedi, da Força Quds.
A ofensiva foi interpretada por Teerã como uma violação direta de sua soberania e levou o governo iraniano a prometer uma resposta "inevitável".
Duas semanas depois, em 13 de abril, o Irã lançou mais de 300 drones e mísseis contra o território israelense. Foi a primeira vez que o país realizou uma ofensiva direta e de grande escala contra Israel.
A maior parte dos projéteis foi interceptada por sistemas de defesa israelenses, com o apoio de aliados ocidentais. Mesmo com danos limitados, o ataque marcou um novo patamar de confronto aberto entre os dois países.
Em 1º de outubro de 2024, o Irã realizou nova ofensiva com cerca de 200 mísseis balísticos como resposta a assassinatos de líderes do Hezbollah e do Hamas atribuídos a Israel.
No dia 26 de outubro, as Forças de Defesa de Israel (FDI) lançaram a "Operação Dias de Arrependimento" (Operation Days of Repentance, em inglês), atingindo alvos iranianos em território sírio, iraquiano e iraniano, de acordo com o The Times of Israel.
Em novembro, o Irã notificou a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) sobre planos para instalar mais de 6 mil centrífugas em suas instalações nucleares, alegando que a medida respondia a uma resolução "injustificada" da agência.
O governo iraniano criticou os países ocidentais, especialmente EUA, Reino Unido, França e Alemanha, por agirem de má-fé e violarem acordos anteriores, como o Plano de Ação Conjunto Global (JCPOA).
Em dezembro, o Wall Street Journal revelou que o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, cogitava ataques aéreos preventivos contra o Irã. Fontes diplomáticas indicaram que a equipe de transição trabalhava em uma nova estratégia de "pressão máxima 2.0".
A movimentação ganhava força após o enfraquecimento de aliados iranianos na região, como o Hezbollah e o Hamas. "Trump acredita que o Irã representa uma ameaça real e está disposto a agir", afirmou uma fonte ligada ao alto escalão.
Escalada de tensões em 2025: mês a mês
Em janeiro, o presidente iraniano Masoud Pezeshkian assinou com Vladimir Putin um tratado de parceria estratégica entre Irã e Rússia, afirmando que "não precisamos ouvir conselhos de países estrangeiros".
No mesmo mês, Donald Trump declarou: "Prefiro fazer um acordo com o Irã do que bombardeá-lo até o fim". No entanto, o aiatolá Ali Khamenei respondeu com desconfiança, classificando qualquer nova negociação como "não sábia, não inteligente e não honrosa".
Fevereiro foi marcado por uma intensificação do impasse. Comandantes da Guarda Revolucionária pediram a Khamenei que reconsiderasse sua fatwa** contra armas nucleares, argumentando que a aquisição desse tipo de armamento seria essencial para a sobrevivência do país.
Ao mesmo tempo, Trump reforçou a campanha de pressão máxima, assinando uma nova ordem executiva para bloquear as exportações de petróleo iraniano e, segundo a imprensa americana, ameaçando o país com represálias militares.
Em março, o tom das ameaças cresceu. "Se eles não chegarem a um acordo, haverá bombardeios como nunca antes vistos", disse Trump. Em resposta, o Irã afirmou estar "pronto para qualquer situação" e prometeu retaliar com força caso fosse atacado.
O presidente do Parlamento iraniano, Mohammad Qalibaf, alertou que "toda a região explodirá como um depósito de munição" se os EUA atacarem. O aiatolá Khamenei foi categórico: "Se cometerem qualquer delito, certamente receberão um forte golpe recíproco".
Durante o mês, a presença militar dos EUA no Oriente Médio aumentou. Dois porta-aviões foram deslocados para a região e seis bombardeiros B-2 foram posicionados na base de Diego Garcia. Paralelamente, Trump estabeleceu um prazo de dois meses para que um novo acordo fosse fechado. O Irã, porém, resistia. "Negociar com os EUA nessas condições é impossível", declarou o chanceler Abbas Araghchi, acusando Washington de fazer exigências irrealistas.
Ao longo de abril, as partes participaram de pelo menos três rodadas de negociações indiretas em Omã. O Irã sinalizou que poderia aceitar inspeções para garantir o caráter pacífico de seu programa nuclear, desde que as sanções fossem suspensas de forma permanente.
Ao mesmo tempo, autoridades iranianas alertaram que Israel e EUA seriam responsabilizados por qualquer ação militar. "Qualquer lugar de onde parta uma agressão se tornará alvo das nossas represálias", advertiu o general Hossein Salami. No fim do mês, Donald Trump indicou que um acordo poderia estar próximo: "Vamos conseguir algo sem ter que lançar bombas em todos os lugares".
Em maio, mesmo com o avanço das negociações, o clima de hostilidade permaneceu. Trump afirmou que, caso o Irã não cedesse, "seria explodido de forma bonita ou cruel". O Irã respondeu endurecendo o tom. "Abriremos as portas do inferno", declarou a Guarda Revolucionária.
Novas sanções foram impostas pelos EUA no dia 12, logo após a quarta rodada de negociações. Teerã rejeitou qualquer proposta que incluísse o desmantelamento de suas instalações nucleares.
Ao final de maio, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu indicou que poderia ordenar um ataque contra o Irã mesmo que um acordo fosse assinado entre Teerã e Washington. "O desmantelamento de toda a infraestrutura nuclear do Irã é a única solução aceitável", afirmou.
O Irã alertou que qualquer ofensiva contra suas instalações, ainda que sob pretexto de segurança, violaria o direito internacional e exigiria resposta imediata.
Junho de 2025: confronto militar aberto
Na madrugada de sexta-feira (13 de junho), horário local, uma ofensiva do regime israelense atingiu Teerã e outras cidades iranianas, resultando na morte de comandantes militares, cientistas e civis.
Em resposta, o líder da Revolução Islâmica declarou em pronunciamento que as forças armadas "farão o regime sionista lamentar" e que "não haverá concessões".
Na mesma noite, a República Islâmica do Irã iniciou a operação "Promessa Fiel 3", com o lançamento de dezenas de mísseis contra os territórios ocupados.
O segundo estágio da ofensiva ocorreu no sábado (14), e, de acordo com informações de campo, imagens de satélite e escutas, os mísseis atingiram alvos estratégicos.
Na tarde de domingo (15), o regime israelense intensificou seus ataques, atingindo áreas em Teerã como a rodovia Hemmat, a Praça Vali-Asr, o bairro de Niavaran e a rua Sohrevardi. As FDI atingiram um bairro residencial e detonaram carros-bomba na capital. Minutos depois, teve início a terceira fase da operação iraniana, com novos lançamentos de mísseis hipersônicos direcionados aos territórios ocupados.
As sucessivas agressões israelenses contra várias cidades iranianas, incluindo Kermanshah e Tabriz, resultaram em ataques de retaliação contra cidades como Tel Aviv e Haifa, onde atingiram a fábrica da empresa militar Rafael, que ajudou na construção do Domo de Ferro (Iron Dome, em inglês), o sistema de defesa aérea projetado para interceptar foguetes.
Na segunda-feira (16), explosões foram registradas em várias partes de Teerã. A rodovia Bagheri, o bairro de Chitgar e o centro comercial Iran Mall tornaram-se alvos de ataques realizados pelas forças israelenses, que também atingiram uma guarnição militar a oeste da capital iraniana.
O Irã iniciou uma nova onda de operações com mísseis balísticos contra o território israelense, segundo informações divulgadas pela agência estatal iraniana Tasnim.
Poucas horas depois, Israel atacou a sede da televisão e da rádio estatal do Irã no meio de uma transmissão ao vivo, interrompendo a transmissão. Três funcionários morreram e dezenas ficaram feridos. Em resposta, o Irã lançou mais mísseis.
Os militares do Irã afirmaram ter destruído um caça israelense F-35 sobre a cidade de Tabriz, no noroeste iraniano. De acordo com a agência de notícias Tasnim, esse é o quarto caça israelense abatido pelas defesas iranianas desde o início das hostilidades.
Na terça-feira (17), a agência de notícias IRNA informou que o Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC) lançou uma nova onda de ataques com mísseis aéreos e espaciais, mais poderosos e devastadores do que os anteriores, contra Israel.
O IRGC afirmou que, como parte da oitava onda de ataques contra Israel, as forças iranianas empregaram "novos métodos" que "interromperam os sistemas de defesa israelenses de várias camadas" de tal forma que "eles atacaram uns aos outros".
O Irã também lançou um ataque com mísseis contra um prédio do Mossad (serviço de inteligência israelense) na cidade de Herzliya, perto de Tel Aviv. De acordo com a Fars, o local que pegou fogo após ser atingido por um míssil iraniano pode ser um centro de logística da inteligência israelense.
No total, na terça-feira, o número de ataques combinados do Irã contra Israel chegou a dez, segundo o Fars.***
Rejeição internacional
- Desde a madrugada de 13 de junho, quando Israel lançou um ataque não provocado contra o Irã, os dois países vêm trocando ataques. Rússia, China e vários países ao redor do mundo condenaram veementemente a operação israelense, chamando-a de grave violação do direito internacional e da Carta da ONU.
- Vladimir Putin condenou esses ataques em conversa com Donald Trump, e expressou "profunda preocupação" com uma possível escalada do conflito, que "teria consequências imprevisíveis para toda a situação no Oriente Médio".
- O representante permanente da Rússia na ONU, Vasili Nebenzia, enfatizou que as ações de Israel estão empurrando a região para uma "catástrofe nuclear em larga escala".
- Na América Latina, vários países, incluindo Brasil, Venezuela, Cuba e Nicarágua, expressaram sua rejeição às ações de Tel Aviv. Países do mundo islâmico, como Turquia, Arábia Saudita, Egito e Paquistão, reagiram de forma semelhante.
Como as negociações sobre o programa nuclear do Irã levaram à ofensiva israelense? Entenda em nosso artigo.
*Aiatolá é a forma como costuma ser referido o sistema político vigente no Irã, liderado por autoridades religiosas xiitas, especialmente o aiatolá Ali Khamenei, líder supremo do país. O termo faz referência à teocracia instaurada após a Revolução Islâmica de 1979, que fundiu o poder religioso e estatal sob liderança clerical.
**Fatwa é um parecer jurídico emitido por uma autoridade religiosa muçulmana com base na interpretação da sharia (lei islâmica). No Irã, onde o sistema político combina estruturas estatais e religiosas, uma fatwa proferida pelo líder supremo, como a que proíbe o desenvolvimento de armas nucleares, tem valor normativo e orienta a política oficial do país.
***Este artigo foi escrito e publicado no dia 17 de junho de 2025. As informações posteriores à esta data, você pode conferir em nosso site.