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Células nazi-fascistas e o perigo invisível das armas 3D no Brasil

O uso de impressoras 3D permite que peças essenciais de armas sejam produzidas em casa, dificultando o rastreamento.
Células nazi-fascistas e o perigo invisível das armas 3D no BrasilArma de aço. Imagen creada por inteligencia artificial.

Em outubro de 2022, no estado de São Paulo, a Polícia Civil desmantelou uma célula nazi-fascista que operava em ambientes virtuais e se preparava para realizar ataques contra moradores de rua.

O grupo, formado por jovens brasileiros recrutados em fóruns extremistas online, utilizava impressoras 3D para fabricar armas e munições de forma caseira — uma estratégia que visava driblar a fiscalização estatal e agir com total clandestinidade.

O caso revelou uma tendência inquietante: a combinação entre radicalização ideológica e o uso de tecnologias acessíveis para construir armamento letal fora de qualquer controle oficial.

A célula fazia parte de uma rede mais ampla de grupos nacionalistas brancos que circulam em plataformas digitais criptografadas, onde circulam não apenas discursos de ódio, mas também manuais detalhados para a fabricação de armamentos.

O objetivo declarado dos envolvidos era "acelerar o colapso do sistema" por meio de ações violentas inspiradas em supremacismo racial, teorias do colapso civilizacional e ideologias nazistas adaptadas à realidade brasileira.

As vítimas escolhidas — pessoas em situação de rua — eram vistas como "descartáveis", num discurso que ecoa práticas genocidas históricas.

Impressoras 3D como ferramenta do extremismo

O uso de impressoras 3D permite que peças essenciais de armas sejam produzidas em casa, dificultando o rastreamento e tornando possível que indivíduos ou pequenos grupos radicais montem fuzis ou pistolas operacionais sem nunca passarem por uma loja de armas ou por qualquer tipo de fiscalização.

Segundo reportagem do jornal O Globo, a facilidade de acesso à tecnologia de impressão 3D vem preocupando autoridades e especialistas em segurança pública no Brasil.

Embora grandes organizações criminosas ainda prefiram importar armas ilegalmente ou desviá-las do mercado interno, o uso descentralizado de impressoras por células radicais ou atores solitários representa um novo e inquietante desafio.

De acordo com Roberto Uchôa, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, "o principal problema é que essas armas são quase impossíveis de rastrear". O comissário Tarcisio Lobato Kaltbach, que participou da operação de 2022, reforça que a letalidade dessas armas caseiras é equivalente à de uma arma convencional produzida por uma indústria certificada.

O risco se agrava com a atuação de figuras que promovem a fabricação de armas 3D com base em uma ideologia "libertária", antissistema e, por vezes, deliberadamente ambígua.

Um dos mais conhecidos é o brasileiro que usa o pseudônimo "Zé Carioca" — inspirado no personagem da Disney — e que ficou famoso pela criação da pistola "Urutau", amplamente difundida em canais alternativos. "É nossa profunda convicção que o direito irrestrito de manter e portar armas é um direito humano fundamental", declarou ele em suas redes.

A primeira arma feita inteiramente por impressão 3D surgiu em 2013, nos Estados Unidos, mas foi em 2020 que o fenômeno se internacionalizou com o modelo FGC-9 ("Fuck Gun Control"), projetado especificamente para contornar leis de controle de armas.

Essa tecnologia se espalhou rapidamente e já foi identificada nas mãos de rebeldes em Mianmar, dissidentes do grupo norte-irlandês IRA e neonazistas na Espanha e na Finlândia.

Em dezembro de 2024, uma dessas armas voltou às manchetes quando o americano Luigi Mangione atirou no CEO da UnitedHealthCare, em Nova York.

No Brasil, a simples fabricação de uma arma já configura crime, mesmo se o autor for registrado como caçador, atirador ou colecionador. No entanto, ainda não há uma legislação específica que regulamente ou restrinja a disseminação de projetos digitais de armamento. Enquanto isso, grupos extremistas continuam a explorar brechas legais e tecnológicas para se armarem.