Homem que se injetou com veneno de cobras por 18 anos contribui para criação de antiveneno

Soro experimental protege contra 19 espécies de serpentes e pode revolucionar tratamento de picadas com ação ampla e inédita.

O caso de Tim Friede, de 57 anos, que injetou veneno de cobras em si mesmo durante 18 anos, ganhou uma reviravolta científica. Após mais de 650 exposições a toxinas, Friede colaborou no desenvolvimento de um antiveneno promissor, criado a partir dos anticorpos produzidos por seu próprio organismo, conforme publicado pelo The New York Times. A nova fórmula pode transformar o tratamento contra picadas de serpente.

"No começo, foi muito assustador", disse Friede. "Mas quanto mais você pratica, melhor você fica, mais calmo você fica."

O antiveneno, que combina anticorpos do sangue de Friede com o medicamento varespladib, foi formulado para agir contra os venenos de 19 espécies de cobras. De acordo com um estudo publicado na sexta-feira (2) pela revista científica Cell, o soro demonstrou 100% de eficácia em testes com camundongos contra 13 dessas espécies e proteção parcial entre 20% a 40% para as outras seis. A pesquisa representa um avanço significativo, especialmente para populações em regiões com acesso limitado a antivenenos específicos.

"Estou realmente orgulhoso de poder fazer algo na vida pela humanidade, de fazer a diferença para pessoas que estão a 12.880 km de distância, que eu nunca vou conhecer, nunca vou falar, nunca vou ver, provavelmente", afirmou Friede, que vive em Two Rivers, no estado norte-americano de Wisconsin, onde cobras venenosas não representam uma grande ameaça.

Estudo

Para desenvolver o soro experimental, os pesquisadores seguiram uma abordagem sistemática e inédita. Eles utilizaram anticorpos isolados do sangue de Tim Friede, que se imunizou por quase duas décadas, combinados com um medicamento de molécula pequena já em testes clínicos. A seguir, o processo detalhado:

Especialistas destacaram a inovação do método. Steven Hall, farmacologista britânico, classificou a abordagem como "criativa" e ressaltou que, por ser baseado em anticorpos humanos, o soro tem potencial para causar menos reações adversas do que os antivenenos tradicionais, geralmente derivados de cavalos.

Embora os testes tenham se concentrado em cobras do grupo dos elapídeos, a equipe também estuda alternativas para neutralizar venenos de viperídeos como cascavéis e víboras, ampliando o alcance da solução. Há ainda planos para iniciar testes em campo na Austrália, com aplicação veterinária em cães vítimas de mordidas.