Trabalhadores brasileiros processam Starbucks por condições análogas à escravidão

Oito ex-empregados relatam jornadas exaustivas em fazendas de café mineiras e pedem indenização na Justiça americana.

A Starbucks Internacional se viu no centro de um escândalo depois que uma investigação revelou trabalho forçado em plantações de café brasileiras ligadas a seus fornecedores. Segundo uma reportagem publicada no jornal The Guardian nesta quinta-feira (24), ficou comprovado que trabalhadores atuavam em condições adversas, sem remuneração nem direito a descanso adequado.

O veículo cita o caso de "João" [nome fictício], recrutado para trabalhar em uma fazenda de café em Minas Gerais que fornecia grãos para a rede global antes de completar 16 anos de idade.

Após mudar-se para o estado mineiro, ele foi obrigado a trabalhar das 5h30 às 18h, com apenas 20 minutos para o almoço, sem receber pagamento ou contar com equipamento de proteção. Em junho de 2024, o adolescente foi resgatado durante uma fiscalização das autoridades brasileiras.

O relatório oficial da operação concluiu que João havia sido submetido a "trabalho infantil em condições perigosas" e que ele e outros trabalhadores tinham sido "vendidos como escravos".

Esta semana, João e outros sete trabalhadores brasileiros ingressaram com uma ação civil nos Estados Unidos contra a Starbucks, com o apoio da International Rights Advocates (IRA). Eles buscam indenização pelos danos sofridos.

Na quinta-feira, a ONG de direitos humanos Coffee Watch apresentou reclamação formal à Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA (CBP), exigindo a proibição da importação de café e produtos derivados produzidos com trabalho forçado no Brasil.

Os insumos destinados a Starbucks, Nestlé, Jacobs Douwe Egberts, Dunkin’, Illy e McDonald’s poderiam ser atingidos pela medida. A organização defende que esses produtos provenientes de uso de trabalho escravo sejam excluídos das cadeias de suprimentos em atendimento à legislação que proíbe o trabalho escravo.

O preço da liderança do café brasileiro

O Brasil é o maior produtor de café do mundo desde o século 19, quando seu avanço foi impulsionado pelo trabalho de centenas de milhares de africanos e afro-brasileiros escravizados.

Atualmente, 66% dos trabalhadores resgatados pelas autoridades brasileiras de trabalhos análogos à escravidão no país são afro-brasileiros.

Estima-se que o setor cafeeiro figure no topo do ranking de atividades com trabalho escravo, influenciado por fatores como servidão por dívida, jornadas excessivas, condições humilhantes de moradia e alimentação e falta de remuneração.

"Especialmente em áreas rurais, nós, negros, somos colocados nessas situações porque não temos outra escolha e precisamos colocar comida na mesa", afirma Jorge Ferreira dos Santos Filho, coordenador da Adere — organização de trabalhadores que ajuda autoridades a identificar vítimas de condições de escravidão. Ele também relata ter sido submetido a trabalho forçado ao menos quatro vezes.

"Para acabar com isso, precisamos que os consumidores se conscientizem de que cada xícara de café que tomam sem questionar sua origem está financiando o trabalho escravo na produção de café", diz Jorge Ferreira.

"É inútil se solidarizar com os trabalhadores ou declarar intolerância a essas práticas se você continuar a tomar café sem questionar sua origem", concluiu.