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'É como um pacto com o diabo': conheça o lado obscuro do OnlyFans

Concentrando uma grande maioria feminina entre seus "criadores de conteúdo", a plataforma impulsiona a compulsão sexual e transforma fantasias pagas em laços emocionais que dificultam o desligamento.
'É como um pacto com o diabo': conheça o lado obscuro do OnlyFansImagem criada por inteligência artificial

Lançado em 2016, o OnlyFans surgiu como uma plataforma para que pessoas de diversas áreas compartilhassem conteúdo exclusivo mediante assinaturas mensais. Na prática, porém, cerca de 70% dos criadores se dedicam à produção de material adulto.

De imagens sugestivas a vídeos explícitos e pedidos personalizados, o aplicativo passou a oferecer aos clientes uma sensação de intimidade, enquanto permite que criadores conquistem independência ao controlar sua própria renda.

Sob essa perspectiva, a plataforma parece "vantajosa" para ambos os lados. No entanto, com o crescimento constante de usuários e produtores de conteúdo — que teve seu auge durante o lockdown na pandemia de Covid-19 —, aumentaram também as preocupações com a saúde mental de quem decide integrar esse universo.

Dos mais de 300 milhões de usuários, cerca de 70% são homens. Já entre os mais de 4 milhões de criadores de conteúdo, 84% são mulheres, e apenas 1% obtém renda anual superior a US$ 100 mil.

Embora os ganhos econômicos pareçam concentrados entre celebridades que levam seus seguidores para o OnlyFans ou entre quem aposta em conteúdos extremos, como a influenciadora britânica Bonnie Blue, que afirma ter feito sexo com mil homens em 12 horas, ninguém está imune às consequências psicológicas.

Um aplicativo altamente viciante

A promessa de renda ilimitada — por meio de assinaturas mensais, mensagens personalizadas, transmissões ao vivo e gorjetas — torna os consumidores vulneráveis à combinação de pornografia com dependência digital.

A liberação de hormônios como dopamina e ocitocina ao assistir conteúdo pornográfico, somada à facilidade de acesso e ao anonimato, faz do aplicativo uma ferramenta com alto potencial viciante.

Segundo a Birches Health, um estudo indicou aumento de 66% em 2023 na busca por ajuda no Reino Unido para lidar com comportamentos compulsivos relacionados ao OnlyFans.

Diversos usuários relataram como o uso do app se tornou um obstáculo à vida cotidiana. Um homem de pouco mais de 20 anos contou à psicoterapeuta Tori McCarthy, especialista em dependência sexual, que passava horas navegando na plataforma, o que dificultava relacionamentos afetivos e sexuais.

O hábito afetou seu desempenho no trabalho e culminou no término com a parceira.

Em outro caso, uma mulher descobriu, após quatro anos de relacionamento, que o namorado era viciado no OnlyFans. Ela percebeu mudanças de comportamento e um zelo excessivo com o celular.

"Eles se apaixonam pelas mulheres com quem interagem"

Diferentemente da pornografia convencional, o uso excessivo do OnlyFans acrescenta uma variável que dificulta o tratamento da dependência: a sensação de afeto e proximidade, ainda que paga.

"As pessoas definitivamente se apaixonam pelas mulheres com quem interagem", afirma Nancy Tricamo, psicoterapeuta em Nova York e diretora clínica do Center for Intimacy Recovery.

Para ela, trata-se da compra da fantasia de um relacionamento parassocial, que oferece a ilusão de companhia.

"Pacto com o Diabo"

A possibilidade de pagar por vídeos ou mensagens sexuais transmite ao cliente uma sensação de poder. Para o criador de conteúdo, quanto mais assinantes, maior o lucro. Isso, no entanto, pode submetê-lo a exigências incomuns de quem está disposto a pagar.

Alex le Tissier, que produz conteúdo adulto, descreveu o atendimento a pedidos cada vez mais perturbadores como "um pacto com o Diabo".

Victoria Sins, que trabalhou como recrutadora para uma agência OnlyFans, disse que depois de ver alguns dos pedidos dos assinantes, ela decidiu mudar de vida e se tornar cristã.

Sins lembra de um homem que pagou para uma mulher usar uma sandália específica, encher balões até um certo tamanho e depois pisar neles, enquanto outro pediu para ver uma mulher pendurada em uma borda enquanto outra mulher pisava em seus dedos.

"Literalmente um fantoche prostituta"

Apesar de muitos enxergarem o OnlyFans como uma ferramenta de empoderamento feminino, ao atingir determinado patamar, as criadoras costumam ser gerenciadas por agências, que assumem o controle da comunicação com os assinantes.

Elas também são pressionadas a divulgar conteúdo sugestivo nas redes sociais para atrair novos clientes.

O crescimento do número de criadoras levou à saturação do conteúdo considerado "comum", o que empurrou muitas mulheres a ultrapassar seus próprios limites para manter o interesse do público.

"Você é literalmente um fantoche prostituta, e seus cafetões são seus assinantes", afirmou Nala Ray, ex-modelo da plataforma, em entrevista concedida no fim do ano passado.

Ela detalhou a atuação no setor, onde faturou US$ 14 milhões em cinco anos, e explicou por que decidiu abandonar a carreira. Ray descreve o aplicativo como catalisador do vício em pornografia nos Estados Unidos e conta que também se converteu ao cristianismo.