
Caso Marine Le Pen: entenda as consequências da condenação

Marine Le Pen, ex-presidente do partido oposicionista Reagrupamento Nacional (RN), foi condenada, na segunda-feira (31), por desvio de verbas do Parlamento Europeu, recebendo uma sentença de quatro anos de prisão e a inelegibilidade por cinco anos na França.
De acordo com a imprensa francesa, o veredicto impede que a política se candidate em futuras eleições, bem como participe da disputa presidencial em 2027.
A responsabilidade recai também sobre outros oito integrantes, atuais ou antigos, do grupo político, que exerceram funções como legisladores eleitos no Parlamento Europeu, assim como Le Pen.
Doze assistentes parlamentares e três demais indivíduos foram condenados, enquanto um réu foi absolvido, segundo a AP. Ademais, o Reagrupamento Nacional terá que arcar com uma multa de 2 milhões de euros.
O advogado de Marine, Rodolphe Bosselut, anunciou que recorrerá da decisão judicial: "Não há recurso contra a execução provisória", disse ele, denunciando um "círculo vicioso".

Do que se trata o caso?
A controvérsia teve início em 2014, quando o Escritório Europeu Antifraude (OLAF) recebeu uma denúncia anônima. Conforme o documento, os assistentes parlamentares da RN (então conhecida como Frente Nacional), contratados para auxiliar os eurodeputados, exercitavam funções oficiais no partido francês.
Com isso, teriam infringido as normas da União Europeia, que determinam que os recursos destinados pelo Parlamento de Estrasburgo para custear assistentes não podem ser usados para financiar contratos firmados com partidos nacionais.

O OLAF concentrou sua investigação nas atividades de duas pessoas próximas a Le Pen: sua chefe de gabinete, Catherine Griset, e seu segurança, Thierry Légier, ambos apresentados como assistentes parlamentares.
Em março de 2015, o presidente do Parlamento Europeu, na época Martin Schulz, apontou possíveis irregularidades relativas aos salários de outros assistentes.
Em 2016, o gabinete do promotor de Paris iniciou uma investigação judicial em dezembro daquele ano, imputando acusações de "quebra de confiança", "ocultação de quebra de confiança", "fraude organizada", "falsificação e uso de falsificações" e "trabalho não declarado".
O Reagrupamento Nacional, juntamente com mais de 20 funcionários, dentre os quais Marine Le Pen, seu pai e ex-presidente do partido, Jean Marie Le Pen, o ex-tesoureiro Wallerand De Saint Just, os ex-vice-presidentes Bruno Gollnisch, Marie Christine Arnautu, Louis Aliot e o ex-secretário-geral Nicolas Bay, entre outros, foram encaminhados ao tribunal criminal.

De acordo com o magistrado, Marine figurava no epicentro de um "sistema" implementado pelo partido para desviar recursos do Parlamento da UE. Embora a política e os demais co-réus não tenham se beneficiado pessoalmente, a decisão apontou que ocorreu "um desvio democrático" que ludibriou os eleitores.
O Parlamento Europeu estimou que o montante total desviado por esse "sistema" tenha alcançado 6,8 milhões de euros entre 2004 e 2016. Após a recusa de Marine em efetuar o pagamento, os setores financeiros do Parlamento descontaram dezenas de milhares de euros de seu subsídio de deputada antes de sua saída de Bruxelas, em 2017.
Sob ameaça de uma ordem de recuperação executiva, Marine restituiu 330 mil euros em 2023. Seu advogado, Rodolphe Bosselut, afirmou que isso "não constitui de forma alguma um reconhecimento explícito ou implícito das reivindicações do Parlamento Europeu".
Vítima de um veredicto "injusto"?
A controvérsia repercutiu amplamente na sociedade e no meio político, com diversas figuras, tanto francesas quanto internacionais, comentando o episódio.
O atual líder do RN, Jordan Bardella, afirmou no X que Marine Le Pen, sua mentora, foi alvo de um veredicto injusto. "Hoje não é apenas Marine Le Pen que está sendo condenada injustamente: é a democracia francesa que está sendo executada", escreveu.

Florian Philippot, presidente do partido francês Les Patriotes, declarou que, mesmo que "o sistema tenha se livrado de Marine Le Pen, [...] está livre para lançar a operação Bardella [o atual líder do RN]", o que possibilitaria sua participação em futuras disputas presidenciais. "Que ninguém se engane: na França, a justiça é sempre política", acrescentou.
Eric Ciotti, líder da União da Direita pela República, ressaltou que "o destino democrático" da França foi "confiscado por uma cabala judicial escandalosa", uma vez que "o candidato favorito nas eleições presidenciais foi impedido de concorrer". Ele ainda afirmou que o atual sistema político e judicial contribui para o declínio do país.
"Agonia da democracia liberal" na Europa
O Kremlin comentou o episódio, com o porta-voz da presidência, Dmitry Peskov, afirmando que "mais e mais capitais europeias estão seguindo o caminho do desrespeito às normas democráticas".
Por sua vez, a porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, qualificou a decisão como "a agonia da democracia liberal".
O vice-primeiro-ministro italiano e líder do partido Liga, Matteo Salvini, definiu a condenação como "declaração de guerra de Bruxelas".
Referindo-se à proibição do candidato da oposição romena Calin Georgescu de concorrer em futuras eleições, ele declarou: "um filme ruim que também estamos vendo em outros países como a Romênia". "Não vamos nos intimidar, não vamos parar: velocidade máxima, meu amigo", acrescentou.
O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, também se pronunciou sobre o caso de Marine. "Eu sou Marine", escreveu em francês nas redes.
Santiago Abascal, líder do partido Vox da Espanha, tuitou: "Eles não conseguirão silenciar a voz do povo francês".
O presidente dos EUA, Donald Trump, também reagiu ao episódio, classificando-o como "coisa séria" e comparando a situação na França com os processos judiciais que enfrentou durante seu governo.

